20 de junho de 2013

Pontos de vista


Os diferentes pontos de vista numa manifestação. Foi escrito a propósito da manifestação de 15 de Setembro do ano passado. Mas tenho a sensação que poderá ser reutilizado este ano.

--O reformado--
Assisti a uma revolução bonita há mais de 35 anos. Um revolução que prometia mundos e fundos. Onde não houve sangue. Já tinha havido antes que chegasse. Sangue de quem não merecia que se lhe tirasse nem uma gota talvez. Mas foram-nos roubando as promessas de Abril e aqui chegámos. Aqui em frente da assembleia mostro a minha indignação pelo que me têm roubado e me querem roubar. Pelos anos todos que trabalhei para este país enquanto sucessivos governos foram fazendo o que sempre soubemos fazer melhor, esbanjar no que não interessa e culpar os pequeninos. Já nem tenho forças para atirar uma pedra como aqueles malucos ali a frente. Nem acho que a violência resolva nada, mas às vezes ajuda. Há que lutar como nos deixarem, se não nos ouvem que nos sintam na pele. E aquelas bestas ali fardadas a enfardar em quem passa ou sem passar aparecem-lhes pela frente. Deviam estar do nosso lado como antes foi.

--Eleitor comum--
Enganou-me bem este Passos Coelho. Já o Sócrates me tinha enganado. Parecem tão boas pessoas antes de irem para o poleiro depois vai-se a ver são todos iguais. Na próxima não me apanham eles, vou votar PS outra vez ver se isto muda que este Passos Coelho só nos quer roubar. Até já começo a gostar mais do Seguro.

--Polícia pai de família--
“Parem com essa merda caralho! Ó Antunes protege-me aqui com o escudo”. Cabrões a tentarem foder-me com pedras da calçada. Mas não os censuro, infelizmente faço parte do que os deixa revoltados. Queria estar daquele lado. Para a próxima estou ali caralho, não me apanham aqui de escudo e capacete. Estes filhos da puta que protejo também me estão a roubar e o meu papel é apanhar quem rouba inocentes. Mas e as contas para pagar? E os filhos para sustentar? Não sei fazer mais nada. Devia ter estudado mais. Se calhar estava desempregado mas estava ali a lutar. E daqui a bocado já sei que vamos ter que ir lá. Vou ter que distribuir bastonadas a torto e a direito. Que merda de profissão às vezes. Já sei que vou acertar num ou outro, numa ou outra, numa criança se calhar, que não tem nada a ver com isto. Mas tem que ser, se vamos é para partir tudo, se não não nos respeitam e partem-nos a nós.

--Anarquista--
Isto hoje é que vai ser, tenho desculpa para partir tudo, mandar uns calhaus na bófia, incendiar isto e aquilo. Isto só vai lá assim é a partir tudo. Porque aquele gajo do ministro da economia “Como é que se chama o gajo ó Cajó? Não sabes? Foda-se nem eu.” Mas sei que nos anda a roubar. A mim não me roubam nada que ganho por fora, mas um dia nunca se sabe. Vamos é partir isto tudo que hoje temos desculpa. 

--Jovem--
Fizeram os meus pais sacrifícios para me pagar os estudos. Estudei 17 anos e agora ninguém me dá emprego. Tirei um curso superior e querem-me pagar 600€ por 10 horas de trabalho por dia sem perspectivas de carreira. Puxaram-me o tapete. Enganaram-me bem com a merda do futuro. Ninguém tem mão nisto. É preciso sangue novo, é preciso povo a gerir o povo não é esta classe de governantes que nunca fez nada na vida a não ser ser político. Se isto é ser político realmente basta uma equivalência porque não é preciso saber grande coisa. Estou farto. Não consigo sair de casa dos meus pais. A minha mãe ficou sem emprego, o meu pai já reformado estão-lhe a ir ao bolso. Que filhos da puta. E aquelas bestas ali em vez de estarem do nosso lado estão a proteger aqueles cobardes. Vou preso, que vá. Mas vou mandar-lhes uma pedra no focinho porque só está ali quem quer. 

--Governante--
Olha para este povinho a atirar pedras e a fazer greve em vez de estarem a trabalhar como eu estou. Se tivessem estudado como eu e feito amigos como eu fiz podiam ter uma boa vida. Só se queixam e não fazem nada. Há que fazer sacrifícios. Nos andamos aqui a gerir isto, a trabalhar no duro e estes que não fazem nada nem querem ajudar. Cambada de povo ingrato. Bem vou mas é preparar o discurso, que não tarda vem entrevistar-me e convém é dizer que ainda não vi imagens nem vi nada para dar uma de ocupado de não dar importância a estes filhos da puta que não querem fazer nada.

--Os outros polícias--
Uga Uga. Olha-me esta ruiva boazona a abraçar-me. Isto de ser polícia é que é bom!

Há muitos pontos de vista, mas devia haver um em comum, é que somos quase todos pessoas e estamos uns contra os outros.



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