5 de outubro de 2017

EMEL vs Arrumadores: antes riscado do que bloqueado



A minha relação com os arrumadores de carros, vulgo "moedinhas", é, há muito tempo, bem definida: se eles me ajudarem a encontrar um lugar, dou moeda; se chegarem apenas no fim da manobra, já com o carro desligado, a correr para dizer «Tá bom, chefe!», não dou. Sendo que sempre tive carros velhos, o ocasional risco não me faz diferença e pode até ajudar a parecer que aquilo tudo é um padrão com desenhos abstractos e aumentar o valor do meu carro de 500€ para 550€.

Penso, várias vezes, no espírito empreendedor do primeiro arrumador de carros. É um génio que se perdeu, ou não, já que houve tempos em que conheci arrumadores que faziam mais de 2000€ por mês. Tinham era vícios caros. Enquanto havia quem pedisse esmola ou roubasse por esticão a ocasional velha coxa que deambulava perdida, houve um gajo que decidiu inventar o seu posto de trabalho. Espero não estar a discriminar quando digo que foi um gajo, mas o que é certo é que mulheres neste ramo são poucas ou nenhumas.


Talvez isso prove que elas não sabem estacionar carros.

Ou pode ser só uma questão de falta de oportunidades para as mulheres no mundo do estacionamento automóvel de terceiros. Se calhar precisamos de quotas, não sei. Bem, esse gajo inventou uma profissão que até à data ninguém se tinha lembrado. Aliás, ser arrumador de carros é ilegal porque não foi ninguém com dinheiro e de boas famílias que a criou. Por exemplo, em alguns hotéis ou parques de estacionamento existem empregados que até te estacionam o carro. Fosse um gajo com três nomes e cunha na Câmara Municipal a lembrar-se e a história dos arrumadores seria diferente. Se calhar até foram os arrumadores a dar a ideia a alguém para criar parquímetros que ao ver esse negócio paralelo pensou «Espera lá... as pessoas dão dinheiro para estacionar o carro? Olha...». E assim nasceram os parquímetros da EMEL e de outras empresas que são uma espécie de arrumadores só que mais caros e só recebem, não dando ajuda a ninguém. São uma espécie de prostituta de luxo que só recebe sexo oral e nunca retribui.

Por norma, a maioria das pessoas dá moeda por medo e isso faz-me pensar que essa relação comercial entre dono do carro e arrumador é uma bonita metáfora para o que está mal no mundo: uns a pedir por necessidade ou vício e outros a dar com medo de um risco na pintura do seu bem de luxo. Por isso, valorizo os arrumadores, tinham outras opções e preferem trabalhar, mesmo que ilegalmente. Sim, não declaram nem pagam impostos, mas isso também a maioria dos donos de cafés e tascas. Há apenas uma situação em que me irrito com os arrumadores que é quando há parquímetro e eles vêm pedir moeda dizendo uma das seguintes frases:
  • «Dê-me a moeda a mim que se eles vierem cá eu meto no parquímetro.»
  • «Eles a esta hora já não passam.»
Hum... desconfio. Não é estar a ser preconceituoso, mas se não podemos confiar nas pessoas de fato e gravata que gerem bancos e governos, como é que vou confiar num gajo de boné, sem dois dentes e com ar de quem mete mais sopa na veia do que no estômago? Por isso, na dúvida, meto sempre a moeda no parquímetro em vez de a dar para a mão do Mário Fábio até porque prefiro, de longe, ter o carro todo riscado de uma ponta à outra do que tê-lo bloqueado.

A EMEL é uma empresa odiada por todos, ódio esse celebrizado no famoso sketch dos Gato Fedorento. Até mudaram as fardas para azul para ver se as pessoas confundem com polícia e têm mais respeitinho. Bem sei que foi por isso, devem pensar que não vos topo, seus marotos. Ninguém gosta deles, mas o que é certo é que das vezes que me multaram foi porque existem leis e regras que não cumpri. Sim, é estúpido bloquearem-te o carro se estiver a tapar uma passagem fazendo com que lá fique ainda mais tempo. Sim, é chato terem colocado parquímetros à porta de minha casa sem avisar já que ter bom estacionamento e gratuito é um dos factores de decisão na compra ou arrendamento de uma casa.


Sim, é chato que o bairro social a 500 metros seja a única zona que ficou livre de parquímetros até porque lá chamam-lhes «Aquelas máquinas estranhas que dão moedas.».

É a vida, chateia-me, mas percebo. O que me irrita na EMEL são outros detalhes sobre os quais tenho algumas dúvidas e se o pessoal da EMEL estiver a ler isto pode enviar-me mensagem já que o vosso apoio ao cliente é, à falta de melhor termo, uma merda:
  • Se um parquímetro estiver avariado? Desloco-me ao seguinte, certo? E se esse também estiver avariado? Quantos parquímetros tenho de percorrer até ser aceitável colocar um papel a dizer «Está tudo avariado!»? É que há ruas que se estendem ao longo de vários quilómetros e se fui de carro é porque não gosto de andar.
  • Se uma máquina me comer dois euros e não der talão, como já aconteceu MUITAS vezes, como é que sou ressarcido disso? Tenho de gastar dinheiro em transportes ou gasolina para ir à vossa sede e perder oito horas do meu dia que valem muito mais do que esses dois euros?
  • Tenho 2€ na carteira, mas só vou precisar de estacionar 15 minutos. Porque não dão troco, seus fuinhas? Vou ter de ir ao café trocar a moeda e arriscar ser multado nesses 5 minutos ou vou ter de vos dar o dinheiro todo. Era as máquinas darem troco ou terem um talão de 10 minutos gratuitos, por exemplo.
Já sei que uma das respostas é «Usa a nossa aplicação!», mas isso não é resposta. Isso é como uma vez que fui a um restaurante italiano; pedi um bife e aquilo tinha mais nervos do que a minha mãe a dar aulas no Cacém a uma daquelas turmas que toda a gente sabe que dali já ninguém se vai safar na vida sem ser no crime. Chamei o empregado que me disse «Os nossos bifes são todos assim, devia ter pedido outra coisa.». Não eram duas chapadas à padrasto bem dadas na nuca? Se têm um produto ou serviço na ementa que não presta, deviam retirá-lo e não aconselhar a comer outra coisa do menu. No entanto, mesmo com tudo isto e com as dez multas que me chegaram a casa numa semana, todas dos últimos dois anos, em locais e datas que não faço ideia se realmente lá tinha estacionado o carro, não demonizo a EMEL e muito menos os seus colaboradores. Das duas vezes que vi o meu carro bloqueado - coisa que devia ser proibida porque no dia que alguém morrer por precisar do carro para uma emergência vai haver confusão - respirei fundo e relaxei. Chamei-os e estive de sorriso o tempo todo ao vê-los desbloquear o carro enquanto pensava «Nem a vossa mãe gosta de vocês. Até a mãe de um arrumador tem mais orgulho no filho.»


PS: Pessoas de Lisboa, Porto, Braga, Guimarães, Coimbra, Tomar, Aveiro, Funchal, Portalegre e arredores, não se esqueçam que os bilhetes para o meu primeiro espectáculo de stand-up comedy a solo já estão â venda nos locais habituais e neste link. Obrigado a todos os que já compraram.




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