24 de outubro de 2018

Casados à Primeira Vista: roleta russa



Como opinador profissional do que se passa no mundo faz parte do meu trabalho ver coisas das quais não me orgulho. Uma delas é o Casados à Primeira Vista, novo programa da SIC, cuja versão em estrangeiro já conhecia porque tenho uma mulher em casa que monopoliza o controlo remoto da televisão. Para quem é muito intelectual e se gaba de não ver televisão o programa consiste em casar duas pessoas que apenas se conhecem no altar, depois de passarem numa bateria de testes "científicos" que calcula a sua compatibilidade enquanto casal. É uma evolução face ao Love on Top e Casa dos Segredos que eram uma espécie de "Mamanço da boca à primeira vista". Tal como o Big Brother e esses seus derivados, acho que pode ser um bom estudo sociológico, mas, tal como esses, temo que seja "mais do mesmo" e que se centre apenas nos dramas semi fabricados em prol das audiências e onde os concorrentes apenas querem viagem de lua de mel de borla, presenças em discotecas e descontos na Prozis.

Ao contrário do que seria de esperar, pelo que se viu no primeiro episódio, os participantes não são pessoas muito feias e anti-sociais e aparentam estar dentro da normalidade sem qualquer tipo de défice cognitivo:

  • Temos um casal de um beto surfista que tem uma forma de falar algures entre o atraso mental e o AVC. A maioria das mulheres achará o rapaz bastante atraente, pelo que se depreende que para ter de concorrer a este programa deve ter uma personalidade de merda. Ele está "supê contente", mas a noiva não parece que o vá aguentar muito tempo.
  • Outro dos casais já passou da casa dos cinquenta e ambos deram como qualidade indispensável num parceiro o facto de ter boa higiene. É assim, chega-se a uma certa idade em que os padrões baixam ao ponto em que nos chega estar lavado para considerarmos meter à boca. Prevejo que seja o único casal que vá durar porque ir para um lar sozinho é uma chatice.
  • Outro dos casais é uma sósia da Ana Bacalhau dos Deolinda, mas com ar mais do Cacém. O noivo que lhe calhau parece ser daqueles gajos que se esforça demasiado para ter piada nos jantares de aniversário e que só é convidado para não termos de criar um grupo de WhatsApp à parte.
  • O outro casal, só mostrado de relance, são duas pessoas fisicamente normais, mas em que a noiva diz que não o acha atraente. Há muita gente que é solteira e que assim fica eternamente, não por não haver ninguém feito à sua medida, mas porque apontam demasiado para cima.
Anda uma mãe a educar os filhos e a dizer-lhes "Não aceites doces nem abras a porta a estranhos" para depois os verem casar com alguém que não conhecem.

Tenho algumas dúvidas relativamente à discriminação que o formato do programa pode suscitar. Desde logo, um cego pode participar num casamento à primeira vista? Parece-me que não. Penso que também discrimina os ciganos, pois para eles este programa chama-se apenas "Casamento". Também sinto que se perde uma oportunidade incrível de fazer um programa de apanhados épico. Exemplos:

  • Noivo vira-se e vê a noiva pela primeira vez e percebe que vai casar com uma anã perneta de 150kg.
  • Noivo militante do PNR percebe que a noiva que lhe calhou é negra.
  • Noiva descobre que o noivo é desempregado e não tem dinheiro.
  • Casar dois primos direitos para procriarem e continuarem a gerar participantes para os restantes reality shows.
Tenho muitas ideias que, infelizmente, ninguém aproveita. Por exemplo, sinto que este conceito podia ser aplicado a outras áreas: eu precisava era de um "Mecânico à primeira vista" onde, depois de uma bateria de testes, me apresentavam um mecânico compatível com os meus níveis de exigência que são altos pois passam por ter um mecânico que não me aldrabe. Sou demasiado exigente, bem sei.

Para finalizar, deixo um padrão que encontrei que vos fará pensar que não passa tudo de uma conspiração para as televisões controlarem todos os nossos sentidos. Reparem no que acontece aos domingos à noite na TV:
Casados à primeira vista - visão
The Voice - audição
Pesadelo na Cozinha - paladar

Se pensarmos que os programas de comentários sobre futebol estão cheios de falta de tacto, isto começa a cheirar a esturro. Sou um génio, eu sei.




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