26 de junho de 2020

Carta aberta (de um pai de família) ao provedor da RTP



Caro senhor Provedor da RTP, é com muito pesar que lhe endereço esta carta aberta. O meu nome é Pedro dos Santos e sou pai de uma família numerosa e católica, uma espécie em vias de extinção, infelizmente. Sou casado com a MINHA MULHER e temos 6 filhos. Como família conservadora que somos, posso assegurar-lhe que só fizemos amor 10 vezes (todas na vagina) e apenas depois do casamento. Sim, infelizmente, três das vezes o sémen não fecundou o óvulo e acabou por ser fazer amor para nada, um desperdício de tempo, mas às vezes acontece. Já sei que o senhor provedor, como homem inteligente que é, deve estar a pensar “6 + 3 é igual a 9, pelo que falta saber o que aconteceu com uma das ejaculações”. Bom, asseguro-lhe que foi uma ejaculação saudável e como Deus quer, mesmo dentro da vagina, e que quis Deus que desse origem a uma vida. Infelizmente, passado alguns meses de gestação, a MINHA MULHER sofreu um aborto espontâneo.

Talvez por isso este assunto me toque ainda mais e escrevo-lhe para demonstrar a minha tremenda perplexidade com uma série infantil exibida na RTP, chamada “As Destemidas”, em que um dos episódios é sobre a vida da senhora Thérèse Clerc, focando-se na sua luta a favor da legalização do infanticídio a que chamam Interrupção Voluntária da Gravidez, ou, mais comummente, aborto. Isto é, além de tentar doutrinar, baralhar a cabeça das crianças. Os meus filhos não sabem nada sobre o aborto, até porque não temos por hábito falar sobre pecados cá em casa. Imagino a confusão na cabeça das minhas crianças ao verem aquilo. Devem estar cheios de perguntas e dúvidas nas suas cabecinhas católicas e puras! Como é que eu vou lidar com as perguntas que antecipo que aí vêm? Como explicar-lhes o que é um aborto? Vou ter de lhes dizer que um aborto voluntário, daqueles que a série promove, é quando a mãe do bebé abre as pernas de propósito e vem a cegonha que enfia o seu bico, na totalidade, na vagina e mata o bebé a leva-o embora. Depois, de certeza que vão perguntar para onde vai o cadáver do bebé, se tem um funeral, se vai para o Ecoponto e se a alma do bebé volta a ser reutilizada. Os meus filhos vão começar com dúvidas se a própria alma deles é em primeira mão ou é refurbished e proveniente de um aborto anterior. Pior, quando acontece o aborto o bebé não está baptizado, por isso vai ficar no limbo com todos os outros abortozinhos? São este tipo de perguntas que me vejo obrigado a responder e a culpa é da RTP2.

Pior, vou ter de lhes explicar que, de vez em quando, por vontade de Deus que só ele sabe, existem abortos espontâneos. Nesse caso não é homicídio porque Deus não pratica o infanticídio (só em África). Tenho de lhes explicar que, nesses casos, a cegonha vem com o bebé no bico para o entregar à mãe, mas Deus sopra uma rabanada de vento e faz com que a cegonha comece a voar por linhas tortas, se atrapalhe e fique presa nuns cabos eléctricos, acabando por morrer juntamente com o bebé. Vou ver-me obrigado a dizer-lhes que o tal aborto que a MINHA MULHER teve foi assim que aconteceu. Que o seu irmão é agora um churrasco de feto electrocutado num cabo de alta tensão algures no Alentejo. Está a ver os traumas que isto pode provocar? Os meus filhos viram o episódio e nem tiveram coragem de tocar no assunto, mas eu notei que estavam transtornados. Até meti os mais novos a ver os desenhos da Disney, especialmente o capuchinho vermelho onde o lobo mau come a avó, para eles descontraírem e desanuviarem… agora que penso nisso, será que o lobo mau comer a avó é uma metáfora para a eutanásia? Lá estão eles a doutrinar as crianças, tenho de proibir a Disney cá em casa! A partir de hoje vêem a missa – que felizmente já voltou – e não precisam de ver mais nada. Sorte tenho eu que a MINHA MULHER não é influenciável e não se mete com ideias de ser independente e trabalhar ou, pior, ser activista. A MINHA MULHER pensa pela própria cabeça e nem preciso de lhe perguntar para saber que ela subscreve na íntegra esta carta.

Com esta doutrinação da RTP2, mais vale deixar os meus filhos usarem o Tik Tok ou verem o Wuant que sempre deve ser menos prejudicial à sua saúde mental e olhem que dizer isto é dizer tudo sobre essa série de animação. Nem vou falar do facto de fazer um apelo à homossexualidade, como se ser lésbica fosse cool. Ainda vou dar com as minhas filhas a beijarem a boca da Barbie Dona de Casa e os meus filhos a enfiarem pinipons no rabo do Action Man. Enfim, esperemos que a educação católica que têm tido lhes dê anticorpos para essas doenças e vírus.

Termino esta carta com a esperança de que o senhor Provedor perceba que uma série destas não devia estar em exibição e peço-lhe que a retire imediatamente.

Obrigado, despeço-me cordialmente.
Pedro dos Santos




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