13 de novembro de 2016

Donald Trump: melhor presidente de sempre



Donald Trump é o novo presidente dos Estados Unidos da América. Presidente do “maior” país do mundo. Presidente do país que tem as chaves da liberdade e a varinha de condão com que espalha democracia pelo mundo à força da bomba e da destabilização seguida de um «amanhem-se, p’raí.» Não fiquei admirado, na minha cabeça sempre achei que ele tinha uma alta probabilidade de ser eleito mesmo com o que diziam as sondagens. Primeiro, porque muita gente tinha vergonha de admitir que ia votar Trump, segundo porque era o único que tinha eleitores ferrenhos que não ficariam em casa. O que me choca não é o Trump ter sido eleito presidente. Acredito que ele não seja assim tão execrável como fez transparecer durante a campanha. Ele não é assim tão racista, xenófobo e sexista. Acreditem que não é. Trump sempre foi mais liberal durante todo o seu percurso. Sempre foi pró-aborto, sempre acreditou num serviço de saúde universal, e sempre foi ateu. Não que ser ateu, por si só, seja sinal de inteligência ou integridade: Mussolini também o era e foi o que se viu. Mas isto mostra bem que ele disse o que disse em campanha apenas e só para ganhar votos. Por isso, o que me assusta não é ele ser presidente, mas sim o facto de ter ganho com os votos daqueles que pensam que ele é uma besta.

É pior um racista autêntico que diz o que pensa, ou um tolerante que se faz passar por racista para ter votos e chegar ao poder?

Vou ser honesto: o meu lado humorista está contente com a vitória de Trump. Como disse George Carlin «O mundo é um freak show e quem vive nos Estados Unidos da América tem bilhete na fila da frente.» Com a vitória de Trump, todos nós sentimos que temos um camarote presidencial para assistir à tragédia com a mesma curiosidade perversa que nos faz abrandar para vermos o acidente na via do lado. Se Trump não arranjar uma guerra nuclear vamos ficar desiludidos, da mesma forma que na estrada temos pena de não vislumbrarmos corpos decepados ao longe para, depois, termos uma boa história para contar à mesa de jantar com a família.

A vitória de Trump mostrou que qualquer pessoa, mesmo fora da esfera da elite política, pode ser presidente do país mais poderoso do mundo. Qualquer pessoa, desde que seja rica e diga o que o eleitorado burro quer ouvir. Não obstante a clara burrice e desinformação de uma grande parte do eleitorado Trump, será que são mesmo todos umas bestas ignorantes e intolerantes à diferença? Creio que não. Creio que no meio daquela mixórdia pouco heterógena de red necks filhos de primos direitos e sem dentes, haja pessoas tolerantes que só estão à procura de uma coisa: mudança. Isso e nunca terem pensado que o seu voto de protesto ia dar merda. A vitória de Trump é uma pedrada no charco podre da democracia. Só que, muito provavelmente, é uma pedrada feita com uma bola de estrume calcificada e, também ela, apodrecida. 

No entanto, vamos lá acalmar as patarecas! Quem teve oito anos de Bush vai aguentar bem pelo menos quatro de Trump. Acho que isto vai ser bom para o mundo, nem que seja só para a pequena parte que restar depois de uma guerra nuclear. Às vezes, é preciso destruir barracas para se conseguir construir as fundações de cimento do bairro social. Trump é um fantoche. Os cordelinhos dos políticos são controlados pela oligarquia corporativa. Pelos milhões e milhões que entram nos bolsos das campanhas e que as fazem pender para um lado ou para o outro. Trump pode ser um outsider à política, mas não o é a essa realidade. Sabe como isto funciona e vai andar na linha. Talvez isso seja o pior disto tudo: a mudança prometida, boa ou má, não vai ser cumprida e vai ser mais do mesmo e, pior, é que o resto do mundo vai ficar contente com isso. 

Há muito que acho que a democracia é um sistema perverso, especialmente num país onde a educação é escassa. Onde há 42% da população a acreditar que Adão e Eva é uma história verdadeira, que os fósseis dos dinossauros foram colocados pelo Diabo para testar a fé dos crentes, e que dizem que a terra só tem 10 mil anos, a democracia tem de dar merda. São 136 milhões de gente com défice cognitivo que não acredita na ciência! Foda-se.

E ainda nos queixamos de ter de ouvir aquela tia velha nos jantares de Natal a dizer que os três pastorinhos viram mesmo Nossa Senhora no cimo de uma árvore.

Num país com este tipo de gente burra e inculta, a democracia não é mais do que uma ditadura das massas ignorantes. Era preciso um ditador com bom-senso. Infelizmente, Trump, apesar de ter perfil de ditador, parece-me desprovido de qualquer senso, bom ou mau. Os americanos são uma manada de gnus que sempre elegeu hienas políticas para governar. Desta vez, fartaram-se e quiseram a mudança votando num leão capitalista. Esqueceram-se que os leões também gostam de gnus aux champignons. Num país onde os meios rurais foram esquecidos e o ensino é podre, é normal que se criem focos de ódio, racismo e xenofobia. Quando os políticos que por lá passaram não lhes deram atenção porque sabiam que não precisavam deles para ganhar, é normal que se tenha semeado a raiva e a crença de que a mudança, seja boa ou má, é melhor do que a continuidade.

Imaginem como se deve estar a sentir a Hillary! Perder para o Trump é como perder ao Trivial Pursuit com a Cátia Palhinha. Os democratas, quando descobriram aquela gravação em que o Trump dizia que agarrava as mulheres pelo pipi, pensaram que tinham ganho. Nunca se preocuparam em mostrar o valor da sua candidata, mas apenas em tentar desvalorizar o adversário. Foi aí que perderam as eleições. Aí e na arrogância sobranceira da Hillary, com a qual acharam que iam conquistar o voto dos mais desfavorecidos. Escolheram uma candidata elitista que não é mais do que um produto do sistema conspurcado e achavam que iam ganhar porque tinham o voto popular. Os democratas fizeram mais barulho pelo Trump ser um gajo carroceiro em privado do que por ser um racista xenófobo em público. Pensaram que um «grab them by the pussy» lhes iria agarrar os votos das mais de 40% de mulheres que diziam votar nele. Já ouvi tanta conversa pior de gajos ordinários e gabarolas que o sururu que se fez por isso, quando ele tinha dito tantas coisas piores, fez-me pensar que até era giro o Trump ganhar só para os bastiões da moralidade e do politicamente correcto ficarem a roer as unhas e as falangetas. 

Se calhar, Trump tem aquilo que é preciso para ser o melhor presidente da américa. Não estou a ironizar! Tem a expectativa mais em baixo do que o segundo mandato de Bush e tem o ego de um sociopata e autoestima de uma jiboia anã. Isso pode ser bom. O facto de ele ter necessidade de aprovação e de que todos gostem dele, pode fazer com que seja o melhor presidente. Pode fazer com que queira conciliar-se com todos e que se preocupe com o que o povo pensa dele. Não acho que ele se vá preocupar com as pessoas e as suas necessidades, mas acho que talvez se vá preocupar com o que elas pensam dele e isso pode ser suficiente para tomar algumas boas medidas. Isso aliado ao facto de por muitos negócios que tenha levado à falência, perceber mais de gestão do que qualquer político de carreira.

À primeira vista, dar a coroa de presidente ao Trump faz-me tanto sentido como o condomínio do prédio ter elegido a minha namorada como administradora. Ela foi eleita numa reunião onde não esteve presente, mas o eleitorado, preocupado com o bem-estar do prédio, juntou-se e pensou «Quem é que vamos eleger administrador? Ah, já sei. Aquela gaja que nunca vem às reuniões, só para a lixar.», sem perceberem que só se estavam a prejudicar a eles mesmos. Quando as pessoas votam assim no condomínio, não lhes podemos esperar mais inteligência na boca das urnas. Não me interpretem mal, a minha namorada tem muitas qualidades, mas tê-la como administradora do condomínio é como ter a Maria Leal como reitora da Escola de Música do Conservatório Nacional.

Por fim, e, talvez, entrando em incoerência com o resto do texto, durante a Web Summit fiz umas entrevistas em que perguntei a várias pessoas, de várias nacionalidades, o que tinham a dizer e se queriam deixar umas palavras ao Donald, sem qualquer censura. Ninguém quis. Nem dois casais muçulmanos do Irão «Temos de respeitar.», disseram-me. Nas redes sociais todos se insurgem, mas ao vivo, somos todos coninhas. Temos de respeitar? Não, não temos. Isto não foi uma eleição entre esquerda e direita e entre ideologias políticas, mais ou menos conservadoras. Isto foi uma eleição em que ganharam aqueles que acreditam que há pessoas inferiores. Uma vitória daquilo que está previsto na lei ser crime: racismo e qualquer outro tipo de discriminação. A opinião de 50% da população americana não precisa de ser respeitada, da mesma forma que eu não respeito alguém que na rua entoe cânticos racistas e xenófobos. Foi o desrespeito que deu a vitória ao Trump e será o respeito que o vai manter lá. 

Respeitinho é bonito e eu gosto, e cá vamos andando como Deus quer.

Apesar de tudo, até acho que devemos estar caladinhos. Um país que deu vinte anos de poder a Cavaco Silva, que elegeu Salazar como o maior português de sempre, e que se revoltou contra a vinda de refugiados sírios para Portugal, não tem nada para ensinar aos outros.





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