26 de julho de 2017

Fatos de banho? Não deixem o biquíni morrer



Chegou o que na Bíblia se descreve como o Apocalipse, os dias do fim do biquíni. Estamos a assistir ao Armagedão da indumentária de praia. Durante anos, a evolução foi feita num só sentido: no da redução do tecido que cobre as mulheres na praia. Era a forma de vermos que a sociedade caminhava para um sítio melhor quando ano após ano, mal abria a época da caça, vulgo época balnear, se via que a sociedade estava mais aberta e despida, literalmente e, também, de preconceitos. Era uma forma de nos lembrarmos que as mulheres fazem o que querem do próprio corpo e que os homens só tem é de virar-se de barriga para baixo na toalha.

Lembro-me de ser petiz, por volta do início da puberdade, em que ir à praia deixou de ser entusiasmante para fazer castelos na areia e dar mergulhos no mar, mas sim para ver corpos femininos seminus. Nessa altura não tinha Internet em casa e, por isso, só os podia ver na praia ou na secção de lingerie do catálogo da La Redoute onde as tangas começavam a dar os primeiros passos. Mais tarde, no catálogo da Reef cujos ténis vinham sempre com uns postais de belas paisagens em segundo plano ofuscadas pelos melhores rabos que Deus e o ginásio esculpiam. Esses postais vendiam-nos um sonho que não existia em Portugal e a ideia que lá fora é que faziam boas coisas, pois nas nossas praias a água não era tão azul e os biquínis não eram tão decotados.


Para além disso, ouso dizer que não se faziam rabos daqueles por cá já que o progresso está para Portugal como os filmes estão para o cinema da Guarda: chegam sempre mais tarde.

Nessa altura, a praia tinha regras simples: biquíni com cueca saco do pão ou fato de banho completo da natação. Os primeiros, para as raparigas elegantes e emancipadas ou para aquelas cujos pais achavam que o que era bom era para se mostrar; os segundos eram para as mães e avós e para as mulheres com problemas em mostrar o corpo, fosse por uma barriga mais saliente, por umas estrias da gravidez ou para esconder o piercing no umbigo que tinham feito com uma assinatura falsa dos pais.

Ao longo dos anos observou-se uma mudança nessas regras e outros tipos de biquíni deram à costa. Todos os Verões se notava uma diminuição do tecido que cobria os corpos morenos. Primeiro, veio o asa-delta que por vezes se confundia com o biquíni de tamanho S que se enfiava entre os glúteos de uma rapariga que o comprou com a promessa falhada de emagrecer até ao verão. Quantas vezes não fui enganado ao ver ao longe uma rapariga e pensar «Txii, aquela de biquíni todo reduzido!» mas, afinal, era só uma cueca do pão enfiada na gaveta de chicha. O asa-delta chegou a Portugal pelos rabos de mulheres que foram passar o verão ao Brasil e, ao início, não foi bem aceite pelas outras mulheres. Era um biquíni que revelava muito e nem todas as mulheres se sentiam confortáveis em expor as suas estrias e celulite. Invejavam as que não as tinham ou tinham mais desinibição para as mostrar e, como é apanágio das mulheres invejosas, apelidaram as outras de porcas exibicionistas. 

Pouco tempo depois veio o fio dental, mais uma vez inspirado pela cultura brasileira do bum bum. O fio dental - daquele mesmo fio - nunca pegou bem em Portugal, excepto nas residentes em bairros sociais e com tatuagens tribais ao fundo das costas. Mesmo com toda a evolução de mentalidades em Portugal, o fio dental era demasiado para nós. Isso e porque só mesmo rabos nota vinte é que o podem usar sem parecerem um molho de carne picada recheada e atada com um cordel para ir ao forno. Mais recentemente, apareceu outro tipo de biquíni: o cortinado. Não falo daquele biquíni com um cortinado em cima como se o rabo fosse um palco onde vai acontecer um espectáculo, mas sim daquele que dá para decidir se fica mais ou menos decotado. Nunca fui fã deste biquíni, até porque desconfio de mulheres com dupla personalidade que num dia querem mostrar tudo e no outro são freiras. Bem sei que dá jeito para ir com e sem namorado à praia, ou com e sem os pais, mas quando vejo fico sempre na dúvida.

Portanto, este foi o percurso normal do biquíni em que todos os anos havia uma maior quantidade de mulheres a apostar nos mais reduzidos. Era uma tendência que nos fazia ansiar pelo verão seguinte, fazendo-nos sonhar com um mundo em que o topless seria a norma. Agora, tudo mudou. Mulheres jeitosas fartaram-se da concorrência e para serem diferentes e se destacarem o que é que foram fazer? Trazer o fato de banho de volta para mostrar às outras que até tapadas ficam bem! Que merda é esta? Bem sei que é um fato de banho que na maioria das vezes tem a parte de baixo reduzida e o rabo à mostra, mas isso ainda é mais parvo.


Fato de banho fio dental é o mesmo que usar leggings com camisola de gola alta. É o mesmo que dormir de cobertor eléctrico com os pés de fora.

Nem nos anos de ouro do Marés Vivas com a Pamela Anderson o fato de banho ficou na moda e agora por causa de meia dúzia de modelos de Instagram que, do nada, começaram a publicar fotografias em fato de banho montadas num flamingo cor-de-rosa, a coisa veio para ficar? Quer dizer... disseram-me porque eu não uso Instagram para ver mulheres seminuas... Uso para publicar demasiadas fotografias da minha cadela e demasiadas selfies quando estou com os copos (se tiverem fetiche por cães e homens embriagados, podem seguir-me em @guilhermercd).

Ainda há alguns que tentaram que o triquíni entrasse na moda. O nome triquíni é estúpido, começamos logo por aí, porque se BIquíni são duas peças, TRIquíni deveriam ser três e, que eu veja, é só uma. Digo eu que apenas sou especialista em roupa de mulher do ponto de vista do observador. O triquíni ainda não pegou porque é feio e deixa um bronze de tapeçaria, mas sempre mostra mais pele! Agora, fato de banho, pá? O mundo está do avesso. Parece que estou numa aula de natação. Só falta usarem touca e molas no nariz para deixar de fazer sentido ir à praia. A praia é como a discotecas: um gajo comprometido não vai lá pelas mulheres, mas se a discoteca fosse só de homens um gajo não ia. Ia comer um pão com chouriço e ia para casa mais cedo. Certo que com o aparecimento do Instagram não é preciso ir à praia para ver rabos decotados já que depois das fotografias de comida e de gatos, os glúteos são as estrelas dessa rede social, mas como homem comprometido, o biquíni era a única forma que eu tinha de ver corpos de mulheres seminuas na vida real sem ter de meter uma peruca e ir a balneários femininos. Aos poucos, estão a tirar-me isso. Curiosamente, com os homens assiste-se ao oposto. Os calções são cada vez mais curtos só porque o Cristiano Ronaldo fez disso moda e os que se esqueceram de comprar calções novos enrolam os antigos da Billabong ou da Quicksilver para cima, como se alguém quisesse ver os seus quadríceps pálidos e depilados. Felizmente, a cueca continua a ser usada só pelo tio Alfredo e a sunga do Sandro está para os homens como o fio dental com tribal está para as mulheres e só pegou ali no pessoal fit das barracas.

«Para o ano vou estar impec e vou usar granda fio dental, migas!» ouvia-se amiúde uma mulher dizer enquanto comia o que ela dizia ser a última bola de Berlim com creme das férias. A morte do biquíni está a tirar essa motivação às pessoas, tanto às mulheres para terem um corpo para mostrar, como aos homens para terem um corpo capaz de engatar uma mulher jeitosa de biquíni reduzido. Temo que num futuro não muito distante seja a burka biquíni, burkini, a entrar na moda. Apesar de ser apologista de que as mulheres usam o que quiserem, uma parte de mim é a favor da lei que proíbe o uso de burkinis em praias de países ocidentais. É uma balança que de um lado tem os meus valores humanitários e liberais e do outro tem a minha testosterona e gosto em ver pele feminina. É uma batalha interna do meu eu civilizado e evoluído contra o meu eu com resquícios da idade da pedra.

Já sei que haverá quem ache que este texto é uma objecficação do corpo da mulher. Já estou à espera de comentários de homens que não conseguem sacar mulheres jeitosas e de mulheres com buço e de mal com a vida. Este texto é, quando muito, um elogio ao corpo da mulher, mas não é a todos que essa teoria de que os corpos são todos lindos e sexys é uma treta e, para além disso, é perigoso. Ter 40 kg a mais, seja homem ou mulher, não é sexy: é perigoso. O culto do corpo perfeito é uma estupidez, mas o elogio e culto do corpo não saudável é, para além de hipócrita, ainda mais parvo. Feito este disclaimer, façam o favor de salvar o biquíni. Nem é por mim, é para um amigo.


PS: Depois do verão vou estrear o meu espectáculo a solo de stand up comedy que vai passar por várias cidades. Se quiserem receber uma notificação por email quando as datas foram reveladas e os bilhetes estiverem à venda, deixem os vossos contactos neste link.




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