Para eu escrever sobre o David Carreira é porque estamos mesmo na silly season. Parece que ele fez o chamado Kiki Challenge que consiste em sair do carro em andamento, dançar um bocado e voltar a entrar. As fãs adoraram, o resto caiu-lhe em cima, dizendo que é uma irresponsabilidade. Fizeram-se boas piadas sobre o tema como uma do Paulo Almeida que disse algo como "(...) Chamem-me antiquado mas gostei muito mais das versões do Dino e do Angélico.". Ri-me.
O que eu acho é que estamos aqui todos a fazer uma tempestade num copo de água. É um challenge estúpido? É, mas é ao que a Internet nos habituou. Ele devia ter mais cuidado porque pode estar a influenciar seguidores a fazer o mesmo?
Devia, mas ele não é responsável pela burrice dos outros e, além disso, os seguidores dele não têm idade para conduzir.
Em termos de influenciar negativamente a juventude, acho mais grave o facto de ele estar com camisola de alças e um boné virado ao contrário. Parece o menino Tonecas da Linha de Sintra. Por fim, no vídeo ele dança ao som da sua música e como o Instagram tem a funcionalidade de auto-play sem som, não me parece assim tão grave este caso.
A PSP diz que "quem adopta este comportamento pode ser acusado de infracção ao art. 3.º do Código da Estrada, ’praticar acto que comprometa a segurança (…) dos utilizadores da via’, que é sancionada com coima até 300 euros." e afirma que "Iremos enviar uma participação à ANSR [Associação Nacional de Segurança Rodoviária], para que seja iniciado o procedimento contra-ordenacional.". É aqui que eu torço um bocadinho o nariz. Se há coisa que todos exigimos é que os famosos e as celebridades sejam tratados de igual forma aos comuns mortais. Não gostamos que tenham facilidades para fazer uma marquise em casa ou para aceder a um empréstimo, não gostamos que passem à frente nas reservas de um restaurante e ficamos fulos quando a polícia fura o trânsito para deixar passar algum político que vai com pressa para chegar a casa. Portanto, se queremos igualdade para o bom, também devemos querer para o mau. O David Carreira, a ser condenado por esta contra-ordenação, sê-lo-á porque é famoso e teve visibilidade no seu vídeo e isso parece-me injusto. Se vamos condenar o rapaz, temos de começar a enviar multas para casa de toda a gente que faz vídeos e tira fotos enquanto conduz. É só ter um agente de autoridade a fazer scroll no Instagram e entre os zooms que faz a mamas encontrará centenas de fotografias e vídeos produzidos pelo condutor de um carro em andamento. É isto que queremos? Se fosse um crime, tudo bem, mas o que ele fez não é crime, apenas contra-ordenação.
Claro que o challenge é parvo, mas não me parece assim tão perigoso: acredito que ninguém queira estragar o seu Porsche e de certeza que é um risco muito controlado; está alguém dentro do carro a filmar e que está a segurar no volante; o carro tem estabilidade; havia pouco trânsito e espaço para circular e até, talvez, o carro esteja em cruise control. Portanto, sendo parvo, parece-me de baixo risco e menos estúpido do que comer cápsulas de detergente. Podemos criticar? Claro que sim, mas quando somos moralistas temos de nos lembrar que provavelmente já conduzimos, pelo menos uma vez, com os copos e já enviámos SMSs ao volante, pelo menos cem vezes. Nos comentários à notícia vemos muita gente a desejar-lhe a morte e a exigir cadeia porque "a lei é para todos". Se vivêssemos dentro do Facebook, Portugal era a Coreia do Norte.
Se a Tesla tivesse criativos tão bons quanto eu, já tinha aproveitado esta oportunidade para fazer um anúncio e dizer "Se o David tivesse um Tesla em vez de um Porsche nada disto teria acontecido, já que o carro estaria a conduzir-se sozinho em segurança.". Estou sempre a dar pérolas às marcas e elas não abrem os olhos.
Não estou aqui a defender o David Carreira até porque ele não precisa da minha defesa, calculo que tenha dinheiro para contratar advogados mais competentes do que eu, mas acho que as notícias sobre o caso foram um exagero: primeiro, é normal que o David, sendo Carreira, faça algo a imitar o outros fizeram; segundo, penso que ele já fez coisas mais graves que justificavam a coima, como, por exemplo, algumas músicas.
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