Já compraram as prendas todas para o Natal? Deixem-me adivinhar, foram hoje às compras e rogaram mil pragas a toda a gente que fez o mesmo que vós? Isso é que é preciso. Eu ainda não fiz compras nenhumas, mas fui observar no seu habitat natural todo o tipo de personagens que existem a fazer compras de última hora nos centros comerciais. Encontrei os seguintes.
O Kamikaze
O Kamikaze é aquela personagem que vai à Primark do Colombo no Domingo que antecede o Natal. Hoje, portanto. Vai sem saber ainda o que vai comprar e fica sempre admirado de haver tanta gente a comprar prendas de última hora. O Kamikaze é kamikaze todos os anos, nunca aprende. Este tipo de pessoa tira algum prazer sádico deste ritual. Adora colocar uma atualização de estado no Facebook a dizer "Na fila da Primark! Esta gente deixa sempre as compras para a última da hora!". Depois vai para casa contar a toda a gente o caos que estava, sem se perceber que aquilo estava cheio de pessoas como ele.
O Romântico
Há sempre um gajo meio perdido nas lojas de lingerie feminina. Começou a namorar há pouco tempo e acha que uma cuequinha sexy é a prenda ideal para a namorada. Anda perdido na Intimissimi, depois de ter passado à porta 12 vezes a ganhar coragem para entrar, anda por lá a sentir-se observado por todas as mulheres que lá estão dentro, a pensar que elas o estão a achar um tarado. Começa a pensar que o pior que lhe podia acontecer ali era ter uma erecção e entra em pânico a qualquer comichão. Não pode disfarçar com as mãos nos bolsos porque ainda era mais estranho. Começa a corar e anda de um lado para o outro, vê dois ou três etiquetas de preços e sai sem nada. Vai à secção de roupa interior da Zara e acaba por comprar um pack de tangas pretas 100% algodão, que a namorada só vai usar para sair à noite com as amigas.
O Salazar
Há sempre este gajo nos centros comerciais, na altura do Natal é ainda mais evidente. É o gajo que olha para toda aquela azáfama natalícia e pessoas com diversos sacos nas mãos e desabafa "Ainda dizem que há crise...". Esta personagem não percebe que fazer compras de Natal, manter um ritual feliz e ter crianças que recebem presentes em casa é para muitos um esforço que tenta contornar a crise. Uma pequena alegria no meio de tanta desgraça. Por outro lado se há crise é porque a economia não vai para a frente e, para que isso aconteça, é preciso as pessoas gastarem dinheiro, não é guardar as maiores reservas de ouro e não as investir. Esta pessoa normalmente é a que se queixa no café, depois de almoço, e refila com os cortes de IRS enquanto bate o 2º maço de tabaco do dia, acabado de comprar.
O Dux
O Dux é aquele que manda outros para o perigo comprar prendas por ele. "Vais ao Colombo hoje? Epá, por acaso não vais à FNAC? Ficava-te a dever um favor se lá me fosses comprar o CD do Anselmo Ralph para oferecer à minha afilhada!". O Dux procura pelos kamikazes nas atualizações de estado no Facebook, mal vê um interessante agarra no telemóvel e diz "Meu puto, como é que é, tudo bem? Onde é que andas? Na Primark? Epá, grande coincidência... Compra-me aí um fato de treino cor-de-rosa para a minha afilhada, pode ser? Fico-te a dever um grande favor!". O Dux é assim, manda os outros levar com as ondas de multidões enquanto fica em casa no bem bom.
O Picuinhas
Há sempre uma pessoa que anda a entupir os corredores das lojas porque tem que ver todos os produtos que lá estão. Olha, experimenta e cheira, se for caso disso. É aquele tipo de pessoa que não compra uma maçã sem apalpar as outras todas do cesto. Este tipo de comportamento é irracional e só faria sentido numa casa de meninas, onde apalpar tudo antes de comprar seria inteligente, se fosse permitido. Agora na secção de computadores da Worten? A tocar em todos os teclados para ver qual é aquele que tem o melhor toque para que seja fácil escrever só com a mão esquerda enquanto afaga o o trombinhas enfiado numa meia de Natal, em que o único presente é o que ele está a dar a ele próprio? Este tipo de pessoas irrita-me e apetece-me dar-lhes com um pinheiro de Natal, com luzes com fios descarnados, na moleirinha.
O Vale e Azevedo
Tal como o Vale e Azevedo, esta personagem adora cheques. É aquela pessoa que se está a borrifar para o Natal e só oferece prendas porque é costume, sem ter qualquer prazer nisso. Vai à FNAC e compra 15 cheques prenda, para os sobrinhos, irmãos, mulher e até para os cães. Entra no centro comercial já com ela fisgada, dirige-se à FNAC, sem nunca desviar o olhar do seu alvo, agarra nos cheques, paga e volta para casa. Mete os cheques num envelope branco, onde escreve o nome do destinatário com letra que ninguém percebe e enfia-os todos num saco de plástico do Continente, porque os do Pingo Doce custaram-lhe dinheiro.
O Sociopata
Há sempre alguém demasiado sorridente no meio da confusão toda. Há dois tipos de sociopatas natalícios. O que já fez as compras todas há 2 meses, já tem tudo embrulhado, com o nome escrito e vai ali só fazer pirraça e regozijar-se com o sofrimento alheio. Aproveitou os saldos de Setembro para ir com uma lista de todos os familiares e amigos, com a prenda respectiva e preço que já pesquisou na net e compra tudo de uma assentada. O outro tipo é aquele que não tem família nem amigos e que a única alegria que tem na vida é perceber que não tem que comprar prendas a ninguém. Senta-se no café, com um sorriso maroto nos lábios, a pensar onde irá gastar o dinheiro que não vai gastar em prendas. Normalmente é em privados no Passerelle, ou em biscoitos para gatos.
O Desistente
Há sempre algumas desistências, depois de uma hora de espera numa fila de alguma loja. Se estivermos a observar de fora conseguimos ver quem está prestes a desistir. Começa a colocar a cabeça de lado para olhar para a caixa, conta quantas pessoas tem à sua frente, conta o tempo que uma pessoa demorou a pagar e faz a estimativa de cabeça a ver quanto tempo vai demorar a chegar a sua vez. Ao fazer as contas, entre suspiros e o corpo irrequieto no lugar, dá-se a desistência. Deixa as prendas todas que tinha nas mãos algures numa prateleira e vai-se embora. Diz que volta amanhã, mas normalmente depois oferece dinheiro a toda a gente. Há outro tipo nesta categoria que é o Terminator. O Terminator é um desistente mais pragmático. Às vezes nem chega a entrar no centro comercial, apenas percorre o parque de estacionamento e ao ver que está muito cheio decide voltar para casa. Quando chega a entrar, fica ali parado durante 5 segundos, a olhar à volta, e toma a decisão de ir embora, dizendo para si mesmo "I'll be back!"
O "quessafoda"
Esta personagem é aquela que compra o que calhar. Escolhe as lojas pelas que têm menos pessoas e compra indiscriminadamente. Apenas tem atenção ao facto se é para homem e mulher, mas às vezes nem isso. Não lhe interessam os gostos pessoais, a idade ou se é algo que a pessoa já possa ter. Nunca receberam um cd de uma banda que vocês não gostam? É normalmente uma prenda desta pessoa. Ofereceu-vos esse cd, não por acharem que iam gostar, ou por terem perguntado a alguém, ou por já vos terem ouvido falar dessa banda. Deram-vos o cd dos Scorpions apenas e só porque foi o primeiro que encontraram na secção de promoções, pegaram nele, pensaram em vocês e disseram "Se não gostar, quesafoda!".
O Gervásio
O Gervásio não é bem um comprador de prendas. O Gervásio é daquelas pessoas que têm dois armários cheios de prendas que recebeu em Natais passados. Prendas foleiras ou sem utilidade, mas que ele guarda para reciclar para os anos vindouros. Uma vez, dona Belmira, minha mãe, reciclou uma prenda de Natal, oferecendo-a à mesma pessoa que lhe tinha oferecido! Erro de principiante, que não seria de esperar de um Gervásio experimente como a dona Belmira. Essa amiga abriu o presente à frente da minha mãe, que se lembrou durante o rasgar do embrulho, que tinha sido ela a dar-lhe. Ao ver o conteúdo do presente a outra disse "Ah... é igual ao que eu te dei...". Ficou um silêncio estranho. Como as mulheres são peritas em ser cínicas a minha mãe ainda disse "Pois, é que gostei tanto que calculei que também fosses gostar!". Já não se falam.
Qual destas personagens é que és? Há outras que eu não encontrei? Deixa nos comentários que a gerência agradece. Em tom de despedida, e embuido pelo espírito natalício e da solidariedade deixo apenas uma sugestão para os mais solitários: Quem gosta de sacar senhoras com mais de 70 anos é ir à Loja das Meias que por esta altura é a maior concentração de tias velhas de sempre. De nada.
PS: Se ainda não sabes o que comprar, aqui fica uma fantástica sugestão: o meu livro. De nada.
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