24 de janeiro de 2016

Portugal é vítima de violência doméstica



Olá, o meu nome é Portugal e sou vítima de violência doméstica. «Olá Portugal!», responderiam os restantes elementos da reunião dos masoquista anónimos. Pois é, não fosse o facto de nos vermos livres do Cavaco, estas eleições seriam mais um dia triste da cronologia política portuguesa. Ganhou, mais uma vez, mais do mesmo. Foi uma substituição daquelas que se fazem no futebol quando o jogo está quase a acabar: uma troca por troca, só para ganhar tempo e adormecer o adversário, ou, neste caso, o povo. Foi trocar o Thomas pelo Fernando Aguiar, ambos cepos e contratações falhadas, mas o segundo expressa-se melhor nas conferências de impressa.


Ontem, Portugal elegeu um Presidente fã de Salazar, adepto de touradas, e contra o aborto. Portugal torna-se, assim, no primeiro país a inventar a máquina do tempo.

Não é que Marcelo não seja capaz de nos representar lá fora e de receber chefes de estado de outros países e de conseguir fazer sala e ter boas conversas. Tenho a certeza que sim. Aliás, conversar e falar será o seu maior atributo politico e, quando assim é, já sabemos que o resto fica descurado. O presidente não faz muito, é um facto. Passeia, manda o seu ocasional bitaite, deixa passar leis e pode mandar tudo abaixo e convocar eleições. Dizem que o Presidente da República deve ser uma espécie de árbitro, algo que olhando para o historial da arbitragem portuguesa, parece-me a pior analogia de sempre. Tal como os árbitros, o Presidente também é subornável e tendencioso, mesmo quando se afirma independente só para angariar votos à esquerda. É como eu dizer à frente dos meus amigos que eu é que mando lá em casa mas depois a minha namorada pôr-me a dormir no sofá e sem sexo durante dois dias.

Marcelo comentador era um bom comentador. Divertido, culto, e de ideias e ideais menos presos à sua afiliação partidária. Era um gajo fixe porque não influenciava nada e, sobretudo, porque não éramos nós que lhe pagávamos o ordenado na TVI. Como Presidente, é mais do mesmo, "só" isso. É melhor do que Cavaco? Óbvio. Qualquer um dos candidatos seria e, talvez, seja esse o grande problema: tínhamos um presidente tão rafeiro que qualquer arraçado nos parece de pedigree elevado. E não estou a comparar cães com políticos, porque isso seria ofensivo para todos os canídeos, especialmente os rafeiros. Marcelo tem o "pedigree" do resto dos políticos que nos têm governado. Vem das mesmas escolas e colégios, dos mesmos partidos, do mesmo círculo de amigos, interesses e favores. É mais do mesmo. É síndrome de Estocolmo.

- O meu marido bate-me e humilha-me. - queixa-se a dona Amélia.
- Então porque não o deixa e arranja outro?
- Oh, tenho medo.
- De quê?
- Da incerteza.
- Então mas este ao menos já sabe que não lhe faz bem.
- Pois, mas outro ainda pode ser pior. É que este bate-me todos os dias, mas no dia dos namorados até me faz um cafuné depois de me partir uma cadeira na nuca.
- Mais vale só que mal acompanhada.
- E depois lá na terra sou a solteirona sapatona? Nem pensar!
- Então não se queixe, dona Amélia. Apanhe aí nas trombas como uma senhora e cale-se.

E, com isto, quero também dizer que não confio por aí além em algum dos outros candidatos, nem tinha um preferido. Só gostava é que Portugal tivesse tido a coragem de fazer as malas e abandonar o marido abusador, mesmo sem ter a certeza se teria de dormir debaixo da ponte durante uns tempos. Mas, não foram tudo más notícias! Tino teve um resultado interessante e acredito que candidatos como ele são precisos, nem que seja para servirem de voto de protesto. E não estou a ser condescendente com ele, acho que de todos se calhar é dos poucos que realmente se iria importar com as pessoas. Ia fazer boa figura nas visitas oficiais? Provavelmente não.


Mas, com o Tino, as mensagens de Natal iam ser um excelente momento de humor que tanta falta faz na TV portuguesa.

«Ó Guilherme, não te podes queixar! Isto é democracia!», dizem alguns que acreditam em unicórnios com pénis forrados de diamantes e rubis e que ejaculam arco-íris. A esses, deixo apenas um exercício para fazerem: ponham lado a lado a percentagem de votos e o tempo de antena nos media de cada candidato e vejam se não encontram um padrão. Pois. Coiso. A falsa democracia começa, para além de termos um sistema de ensino moribundo, no facto de se ter de ter mais de 35 anos para se ser candidato à Presidência da República, e de se ter de ser português. Se calhar, o mal é esse. A selecção portuguesa teve os seus melhores resultados sob o comando de um estrangeiro e, pelos vistos, nós com prata da casa não saímos da cepa torta. Mandem vir o Obama, nem que seja só para chatear o PNR.

Marcelo tinha a papinha toda feita. Anos a fazer campanha deram-lhe uma vitória confortável sem precisar de se esforçar muito. Até se deu ao luxo de ser independente! Haha, esta piada ainda é melhor que aquela da Marisa Matias. Marcelo, o candidato, apresentou zero ideias e esquivou-se a todas as perguntas complicadas. A sua campanha resumiu-se ao que seria de esperar que o Tino fizesse: andar a passear, a comer petiscos, a dar beijinhos e abraços às velhinhas e crianças. De repente, Marcelo virou do povo. De repente, Marcelo deixou de ser o devorador de livros, professor, doutorado, amigo de banqueiros, para ser do povo. Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és. É certo que não podemos controlar nem somos responsáveis pelas escolhas errados dos nossos amigos, mas tenho para mim que uma pessoa inteligente percebe que algo se passa de errado. Exemplo:

- Então, Pedro, compraste um Porsche? - pergunto eu a um amigo de longa data.
- Sim, estava na dúvida entre esse e o Ferrari. - responde ele todo pimpão.
- Sim senhor, anda-te a correr bem a vida. - comento.
- Sim, fui promovido a supervisor lá no call center.

E eu, se fosse atrasado mental, não desconfiava que era porque o Pedro é traficante de droga e/ou anda a fazer felácios por 50€. Ou por 5€, mas trabalha horas extra. Depois a PJ apanhava o Pedro e eu era chamado como testemunha e dizia que nunca tinha visto nada suspeito. Enfim, Marcelo pode não ser má pessoa, o grande problema é que para se ser presidente ou primeiro-ministro é preciso estar embrenhado no mundo da política. Ter feito parte das jotas e ter crescido lá dentro. E, quem segue esse caminho, é impossível chegar ao topo sem dever favores a muita gente e sem ter dado graxa a tantas outras.


E, no fundo, é a isso que se resume a grande maioria da nossa classe política: uma cambada de graxistas que devem favores a outros graxistas.

É uma pescadinha de rabo na boca, mas quem está na cauda desta centopeia humana somos nós, onde apenas nos dão a comer o pão que o intestino deles amassou.

Numa carta que Marcelo escreveu a Salazar, quando tinha 12 anos, despedia-se do seu ídolo com «o seu humilde servo». Sim, as crianças de 12 anos idolatram as pessoas erradas, mas, pelos vistos, mais de 50% dos adultos que votaram, também. «Era a única opção! O menos mau entre todos os candidatos!», dizem alguns. Se isso for mesmo verdade, acho que ainda é pior sinal para Portugal e todos nós.




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