15 de abril de 2016

Fotografar comida para o Instagram. Ridículo?



O mundo está perdido! Este domingo vai haver um workshop para ensinar as pessoas a tirar fotografias de comida com o telemóvel para terem mais likes no Instagram. Juro! Até foi notícia em alguns sites!

Mas anda tudo parvo?!

Não vou dizer o local nem a empresa que o vai fazer porque não gosto de fazer publicidade gratuita a palermices, mas digo-vos que terá a duração de três horas e custará 35€! Calma, já sei que devem estar a pensar «Que anormalidade!» e fazem muito bem em pensar isso por que só mostra que são pessoas com bom senso e inteligência. O workshop chama-se #instafood, porque em português, comida instantânea, ficava mal e mostra, claramente, que quem dá cursos destes não tem criatividade para mais.

Podia ser um curso de fotografia a comida, isso seria normal, com câmaras a sério, macro, luz, conjugação de cores, etc. É algo que pode fazer sentido para quem trabalha em publicidade, fotografia freelancer ou para quem tem um tasco e quer meter aquelas fotografias nos menus que vão perdendo a cor ao longo dos anos. Assim seria um curso que eu compreendia que existisse, agora um workshop de fotografia com o telemóvel para colocar no Instagram e ter mais likes? Quais Panamá Papers! Esta merda é que me preocupa enquanto membro da espécie humana.

O mal não é tirar fotografias a comida, é normal que se faça de vez em quando, mas não há dúvidas que irrita quando é todos os dias aquela foto do sushi. Ou do café gourmet. Ninguém quer saber que vocês comeram uma salada com superalimentos, sementes de chia e bagas de goji, e topping de pelos púbicos de um albatroz da Serra Leoa. Confesso que em jantares de grupo também tiro muitas fotografias, mas é às pessoas que lá estão porque é isso que me interessa recordar no futuro. São as pessoas e não os bifinhos de peru com cogumelos do menu de grupo que nem estavam assim tão bons. Se calhar o meu problema é esse: não ter dinheiro para ir a restaurantes finos que se empenham mais em embelezar o prato do que a temperar a comida. Chamem-me antiquado, mas prefiro comida que fique melhor nas minhas papilas gustativas do que no meu Instagram. É toda uma nova etiqueta que eu não sei. Pode-se comer enquanto outras pessoas ainda estão a tirar fotografias à comida? Tal como os talheres, existem filtros para carne e filtros para peixe? Quais as hashtags que acompanham bem com grelhados? Sinto-me desadequado neste mundo novo! Antigamente, a competição e gabarolice com a comida era na ceia de Natal quando as tias começavam a discutir qual das suas sobremesas é que era a melhor enquanto iam colocando defeitos umas nas outras. Hoje, o exibicionismo gastronómico é todo digital.

Como já aqui escrevi anteriormente, as únicas pessoas que faz sentido que tirem fotografias a comida são as crianças africanas subnutridas para terem um souvenir de algo que podem não voltar a ver. Isto está a chegar a um nível de ridículo. As pessoas estão descontroladas. Alguém que lhes enfie uma garfada na boca enquanto elas estão a tirar fotografias à comida. Aquelas frases feitas que todos ouvimos enquanto crianças como «Não se brinca com a comida.» tem de levar um update para a nova era digital e passar a ser «Não se brinca com a comida nem se deixa que arrefeça enquanto se tiram fotografias.».

Antigamente, uma sardinha tinha de dar para 4 pessoas. Hoje, uma sardinha tem de dar para 4 fotografias para o Instagram.

Se as pessoas partilhassem tanta comida como partilham fotografias de comida, o mundo era um local melhor. Pergunto-me se o pessoal que tem de recorrer ao Banco Alimentar, quando chega a casa também tira uma fotografia à lata de atum e aos pacotes de leite que teve de ir pedir. Pergunto-me se quando vão dar um caldo verde a um sem-abrigo ele saca do seu iPhone e pergunta «Por acaso não têm chouriço? É que o contraste do vermelho com o verde ficava impecável nesta fotografia para pôr com as hashtags #foodporn e #SopaDosPobresComDesign que estão a bater bué!». Ainda assim, não estou aqui para ser moralista nem acho que quem coloca fotografias da comida, mesmo que todos os dias, seja uma pessoa ridícula. Agora, que quem vai pagar e perder tempo para ir a este workshop é um palerma, lá isso é. Já que voltámos ao tema do post, o workshop de food photography and design, sim, porque é assim que lhe chamam. É, obviamente, dado por uma estrangeira só para dar aquela credibilidade que o português tanto gosta. Samantha McMurray de seu nome, é a formadora que vai ensinar pessoas como se tira uma boa fotografia com o telemóvel para ter likes no Instagram. Ou no Insta como dizem as pessoas que também dizem Face e que mereciam uma chapa nas tromb.

Vai ser dado um atelier e tudo, meus amigos! Isto é arte! Tirar fotografias com o telemóvel a comida é arte! Tem tanta coisa para aprender que vão ser precisas três horas e pagar 35€ para ficarmos mestres! Dizem até que quem tirar este curso vai conseguir boas fotos com um Nokia 3310. Reparem, que a senhora dê o workshop tudo bem, há que saber onde se pode fazer dinheiro, mas quem são as pessoas que pagam para ir a isto? Quem são, a sério? Onde é que elas andam? É pessoal que tem demasiado tempo livre e demasiado dinheiro na carteira? É pessoal que tem problemas mentais e isto é uma espécie de atelier ocupacional? Aposto que quem vai encher este curso são as mesmas pessoas que depois dizem aos amigos que não podem ir aos jantares de aniversário porque andam mal de dinheiro. «Vais fazer o jantar onde? No Zé do Pipo? Epá, isso é muita caro, o menu são 15€. Ao menos tem hashtag própria com muito engagement? Se me disseres que vai estar lá uma senhora estrangeira a ensinar como se tiram fotografias aos secretos de porco preto, ainda era capaz de compensar. Secretos é muita difícil de fotografar por causa do reflexo do flash na gordura.». Era enfiar-lhes uma salada de pepino inteiro no rabo e chamar um grupo de turistas para fotografar.

Inspirado por este curso, vou também dar o meu próprio workshop de fotografia. Chama-se #InstaDicks e vai ensinar a bela arte do cock photography and design. Só precisam de levar um telemóvel com uma câmara razoável e o conteúdo programático é o seguinte:
  • Técnicas de aquecimento;
  • Técnicas de maquilhagem de pénis para ficar mais veiudo;
  • Enquadramento e escala;
  • Os melhores ângulos para quem tem o pénis pequeno;
  • Filtros? Sim ou não?
  • Como retocar o pénis com o Photoshop para tirar as verrugas e o herpes;
  • Como podar o bonsai para a foto ficar top.

Vai realizar-se no atelier Javardaux e terá a duração de cinco minutos porque a maioria dos homens não aguenta mais tempo. Vai custar 1€ por cada centímetro que é para quem é menos dotado ter pela primeira vez uma vantagem com isso. Para não se armarem em Bloco de Esquerda e virem dizer que é um curso discriminador de género, vou também fazer outro workshop #Boobalicious cujo conteúdo será o seguinte:
  • Como evitar comentários a elogiar os olhos em fotos à porca;
  • Melhores frases foleiras para acompanhar a fotografia do decote;
  • Será que a fotografia tirada do ângulo de cima para disfarçar o duplo queixo e realçar as mamas ainda resulta ou é como o soutien almofadado e já toda a gente desconfia?
  • Sideboob ou underboob? Qual é melhor para ser pedida em casamento?
  • Quais as redes sociais que permitem mamilos?
  • Instagram VS Pornhub.

Obviamente que os dois cursos serão dados em simultâneo já que a presença de mulheres a tirar fotografias artísticas ao seios vai também ajudar na fase de aquecimento e preparação do workshop dos homens. Penso em tudo. Sou praticamente um génio.

Em suma: tirem fotografias à vontade. Da comida gourmet. Da folha de rúcula. Do coração desenhado em vinagre balsâmico. Do petit gateau do Pingo Doce. Tudo. Tirem à vontade, mas não gastem dinheiro em cursos destes onde não vão aprender nada. Tenham juízo.




Gostaste? Odiaste? Deixa o teu comentário: