4 de setembro de 2017

Aventura na Croácia - Parte 1/3



Como é que estamos? Bem? Com depressão pós-férias? É sinal que foram boas. Para efeitos de recordação futura quando tiver Alzheimer, vou fazer como já fiz da vez em que me aventurei em Marrocos e contar-vos as minhas férias só porque sim. Foram baratas, por isso não vou meter muito nojo. Pensem nisto como um guia turístico, mas daqueles em que ninguém me pagou para dizer bem nem tenho de promover a tasca de um tio que tem o melhor bitoque, mas que depois, afinal, é sola de sapato com a gema do ovo sem estar crua.

Quem estrela ovos e deixa a gema cozer, merecia que lhe enfiassem os dedos na frigideira até ficarem bem passados. 

Bem, vamos lá então. Fomos três casais heterossexuais brancos, não porque discriminemos casais do mesmo sexo ou de outras etnias, mas simplesmente porque assim calhou e porque ainda não é preciso preencher quotas nas férias. Foram as mulheres que ficaram de marcar as férias para mostrar que são independentes e proactivas, mas adiaram tanto que acabaram por ser os homens a tratar de tudo o que eram voos, hotéis e aluguer de veículo de quatro rodas. É bom ver que as tradições ainda se mantém. O destino? Não acredito nessas coisas, mas foi avião até à Croácia, onde alugaríamos uma carrinha suficientemente grande para seis pessoas e malas de três mulheres para 11 dias e com a qual percorreríamos a costa croata, Montenegro e a Bósnia.

Marcadas com três meses de antecedência, o que só piorou a minha angústia da espera pela viagem de avião, lá chegou o famigerado dia em que eu me meteria, mais uma vez, numa camioneta com asas conduzida por um taxista mascarado de piloto. Croatia Airlines, ainda por cima, essa companhia aérea de alto gabarito. Fui de directa, tomei jarda para dormir, não dormi, paniquei aqui e acolá e fui durante três horas a conter o ataque de pânico iminente que sentia a brotar de dentro de mim, qual Hulk mariquinhas. Aterrámos em segurança, as pessoas bateram palmas, não sei se ao piloto ou aos engenheiros que conseguiram fazer com que aquela lata velha desafiasse as leis da gravidade.

Fomos buscar a carrinha e seguimos viagem em direcção à primeira cidade: Pula. Foram cerca de 300 km onde verificámos que as portagens são mais caras do que em Portugal e as estradas são piores. O limite é 130 km/h, ou, traduzindo para limite à tuga, 160 km/h. Vislumbrámos paisagens bonitas, mas também muitas cidades que pareciam Rio de Mouro depois de uma praga de gafanhotos nucleares. Chegámos ao apartamento em Pula e fomos recebidos pelo Goran, Guronzan para os amigos, que nos recebeu com uma enorme simpatia e disponibilidade em ajudar, fora o facto de nos ter dito que o restaurante que nos aconselhava ficava a 5 minutos a pé, mas como sou desconfiado fui ver ao mapa e ficava a 3 km. Os croatas devem andar sempre a sprintar de um lado para o outro. Lá fomos para o restaurante que se chamava Lavanda que, como podem ver na foto, estava ali na linha ténue que separa o pitoresco e o motel para onde se levam prostitutas de rua.

Jantei uma grelhada mista, a primeira de muitas, como irão ver ao longo das três partes desta aventura. Estava razoável, mas em qualquer tasca portuguesa se come melhor e mais barato. Bem sei que nas zonas costeira da Croácia se deve é comer peixe e marisco, mas aqui o menino não aprecia bicheza do mar. 

Quem gosta de sapateira não tem critério. Se a sapateira andasse na selva em vez de no mar, toda a gente tinha nojo daquela tarântula gigante com pinças peludas.

Quando vou a Sesimbra peço um bitoque, sou esse tipo de pessoa que faz com que os empregados que dizem que o peixe é muito bom revirem os olhos. A cerveja deles faz lembrar a nossa, mas tem de ser bebida aos meios litros de cada vez porque homem que é homem bebe o seu peso em imperial ao lanche. Outra coisa que se bebe muito na Croácia é sumo de Pipi. Calma, vejam a foto em baixo e reparem que o designer não deve ter colocado as laranjas naquela zona por acaso.
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A cidade era razoável, mas nada de especial. Tem um coliseu a fazer lembrar Roma dos trezentos, um centro histórico pequeno para passear, e pouco mais. Valeu pelas praias, cuja água era como o Jorge Jesus gosta, limpinha, limpinha, e quente como não há em Portugal. Nem tudo é perfeito e, por isso, a areia era uma espécie de gravilha de parque de estacionamento ou rochas que dilaceram as plantas dos pés. A contar com isso levei uns sapatecos daqueles que os velhos usam para não pisar o peixe aranha. Não me orgulho.

Depois de duas noites, deixámos Pula em direcção a Split, mas primeiro parámos na jóia da coroa da Croácia: os lagos e cascatas Plitvice. Chegando lá, deparámo-nos com uma enchente de pessoas para comprar bilhete! Uma bicha maior do que o Polícia da Moda da CM TV. Piada fácil, mas apeteceu-me. Calem-se. No entanto, reparámos que havia outra fila, com um décimo das pessoas, que parecia ser também para comprar bilhetes. Entranhando e não querendo arranjar confusão com croatas de fato de treino, perguntei ao segurança e ele disse-me que ambas davam para comprar bilhetes e que podia ir para a que quisesse. Depois de muito pensarmos se queríamos esperar duas horas ou 10 minutos, optámos pela segunda. A psicologia de massas é assim, o pessoal vê uma fila grande e mete-se atrás a pensar que ali os bilhetes estão a sair do forno. Burros. Lá entrámos no parque sem nunca ninguém nos pedir bilhete e percebemos que havia uma terceira fila que era a de ir à confiança e não gastar dinheiro. Quem lá for, já sabe. Começamos a percorrer aquilo a pé enquanto íamos absorvendo toda aquela paisagem idílica, com água cristalina, quedas de água e verdura de fazer água na boca a qualquer vegan. Andámos uns dez quilómetros, tudo de chinelo menos eu que sou esperto e levei ténis. Ficaram todos cagados de lama? Ficaram, mas os pezinhos do menino não sofreram tanto.

Depois de tudo visitado e de contemplarmos o esplendor da obra que Deus fez em apenas um dia, fomos embora de coração cheio, pés doridos, e sovacos suados. Chegámos a Split, ao cair da noite, e a localização do apartamento não coincidia com as fotos do local. Pensei logo que tínhamos sido aldrabados, mas liguei ao dono da casa e ele veio buscar-nos. A casa era ao pé de um estádio de equipa distrital que tinha estampado em grande "White Boys", com a bandeira dos Confederados Americanos, que vim a saber serem uma claque do Hajduk Split. Não há melhor vizinhança do que os nazis supremacistas brancos. 

Ninguém te protege melhor do escuro do que um neo nazi.

O rapaz que nos alugou a casa tinha todo o ar de fazer parte dessa claque e ficámos felizes por sermos todos brancos heterossexuais. Era muito simpático só que demasiado. Sabem aquelas pessoas com muita energia e que se agarram, tocam e abraçam pessoas que acabaram de conhecer e dão aqueles socos fingidos na barriga dizem «Ahhh, sabes como é que é!!»? Népia, não sei como é que é. Fora isso, muito simpático, deu-nos uma garrafa de vinho como boas-vindas e do apartamento dele vinha um cheiro a ganza nas escadas, mas disso ele não ofereceu. Pelo sim pelo não, era melhor não ficarmos muito morenos para continuarmos a fazer parte da palete de cores aceitáveis daquela zona.

Split à noite é tipo Albufeira em Agosto e cada um tira as conclusões que quiser. Durante o dia a cidade velha é muito gira, com ruelas pitorescas e tudo muito bem conservado. Percebemos, mais uma vez, que na Croácia tudo funciona com código de honra: pagámos uma viagem de barco na qual ninguém nos pediu para ver o bilhete que havíamos comprado no dia anterior. Ninguém. Foi entrar no barco e seguir. Fomos a três ilhas, mergulhamos no meio do mar Adriático e fizemos cerca de 4 horas no total numa traineira na qual o senhor do barco nos veio pedir para não estarmos todos do mesmo lado porque aquilo virava. Já na cidade, pagámos para subir a uma torre com escadas de metal onde faltavam parafusos e parecia ter gente a mais. Não tenho vertigens, mas senti algum desconforto. Pior estava uma senhora que precisou de parar para descansar ao primeiro lanço de escadas - só faltavam uns 50 - gabo a coragem, mas há que ter noção das nossas próprias fraquezas. Claro, mais uma vez, que ninguém nos pediu bilhete e bastava termos entrado de queixo erguido. Os croatas não devem ter muitos turistas portugueses, caso contrário, começavam a perder dinheiro porque para a próxima já sei que vou ter de recorrer à chico-espertice, tão tipicamente tuga. Depois de um dia bem passado, fomos jantar fora. Jantei o quê? Grelhada mista, pois está claro.

Bem, na próxima parte conto-vos como foi Dubrovnik e Kotor que há que fazer render o peixe depois de tanta grelhada mista de carne manhosa.

PS: Parte dois já disponível neste link.




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