8 de junho de 2015

Tenho medo de andar de avião



Estou a escrever este texto no Domingo e já sinto dentro de mim um nervoso miudinho de quem vai apanhar um avião amanhã às 7.30h em direcção a Londres. É possível que enquanto estiverem a ler isto eu esteja sentado numa cadeira de um avião, de esfíncter mais contraído do que a boca de um antílope que provou limão pela primeira vez. Confesso, tenho medo de andar de avião. Não é receito, é cagufa mesmo. Medinho daquele que faz borboletas na barriga e que depois vai-se a ver e é cocó mole e aguado. Só há outra coisa que me faz sentir assim para além de andar de avião: fazer stand up comedy. No entanto nesta última sei que à partida não irei falecer numa morte dolorosa, a não ser que no público esteja um jihadista, um toureiro, um católico fanático, um gajo do PNR ou um gajo da FNAC que ficou ofendido com eu ter gozado com um colega que não sabia quem eram os Led Zeppelin e pior, que os apelidou várias vezes de Zed Leppin.

"Que estupidez Guilherme, não sabes que avião é um meio de transporte altamente seguro?" perguntarão alguns de vós muito pertinentemente. Eu sei disso, o lado racional do meu cérebro sabe isso, caso contrário nunca me meteria numa lata com asas. Agora pergunto-vos eu, quando jogam no euromilhões não há uma parte de vós que tem esperança em ganhar? Não vão ver os números com uma fé irracional de estarem milionários? Pronto, é assim que eu entro num avião, a pensar que embora seja muito baixa a probabilidade, poderá calhar-me a mim. É milhares de vezes mais provável morrerem de acidente de avião do que ganharem o euromilhões, fiquem sabendo. Aliás a minha forma de racionalizar é pensar que ao menos enquanto estou a voar não posso morrer num terramoto. Sou um optimista. Eu nem gosto muito de andar de carro a pendura com pessoal que não conheço bem, quanto mais andar a centenas de metros de altura, a mil quilómetros por hora, com um gajo ao volante que eu nunca vi na vida. "Ah, mas os pilotos são altamente qualificados e competentes", dizem alguns. Não meus amigos, aquilo são taxistas. Taxistas! Ainda por cima na sua maioria são adeptos da boa vida e passam o tempo a emborcar e ressacados que eu bem vejo os vizinhos da minha namorada que são pilotos e fazem festas até às tantas em que inclusivamente se ouve "Vai Nádia Diamonds, a pista é tua!". Não tenho nada contra transformistas, acho que a Nádia Diamonds poderá pilotar um avião tão bem quanto o Nando Pedras, só tenho receio que se espete contra uma montanha enquanto está a retocar a maquilhagem, a peruca e compõe os enchumaços das mamas.

Só andei uma vez de avião. Mentira, andei duas porque tive que voltar.

Foi há 4 anos e também voei para Londres, sozinho feito herói. A partida era por volta das 8h da manhã e claro que não dormi nada nessa noite, tal como não vou dormir nesta. Levava no bolso drogas legais que apenas são vendidas com receita médica mas que eu arranjei por fora porque sou uma pessoa com bons contactos nas áreas que interessam. Acabei por tomar nenhum comprimido porque achei que ia ser um voo mais interessante para toda a gente se me desse um ataque de pânico a meio da viagem. Já me imaginava a gritar "Metam-me no chão! Quero sair!" e as hospedeiras a agarrarem-me de forma carinhosa enquanto me sussurravam ao ouvido de forma terna "Deixa de ser maricas e senta-te!". Nisto eu dizia "Não me deixam sair, é? E se eu disser bem alto a palavra que começa por um B e acaba em omba?". O resto era história para aparecer na primeira página do Correio da Manhã. Bem, lá fui, o avião descolou e eu pensei "Bom, agora já está, se cair não há nada que eu possa fazer" e acalmei. Acalmei cerca de 2 minutos até o comandante dizer "Senhores passageiros, informamos que teremos alguma turbulência nos próximos 20 minutos". Por "alguma turbulência" eu entendi "Isto vai tremer pa caralho! Agarrem-se, rezem e chamem pelas putas das vossas mães!". Tremeu um bocado, alguns poços de ar e tal mas nada de muito grave que me fizesse virar subitamente religioso. Ia um senhor na casa dos 40 anos ao meu lado que deve ter percebido a minha cara de pânico enquanto olhava para as hospedeiras, não para as apreciar, mas numa tentativa de me acalmar, já que enquanto elas estivessem a sorrir é porque as coisas estavam bem.

- Então, tem medo de andar de avião? - pergunta ele num tom paternal.
- Nota-se muito?
- Ha ha nota-se um bocadinho nota, está um bocado pálido.
- Pois, acho que o sangue está todo na barriga.
- Com tanta hospedeira boa devia era estar noutro sítio! Não era?
- Impossível, podia vir a mais gostosa sentar-se ao meu colo que nada iria funcionar... quanto muito tinha um ataque de claustrofobia.
- Ha ha ha, não tem nada que ter medo pá. Eu já devo ter andado de avião umas 200 vezes.
- Não me diga isso...
- Porquê?
- Porque quanto mais se anda mais probabilidade se tem de ter um acidente, o que significa que sendo a sua 200ª vez, a probabilidade de este ser o avião que cai é mais alta do que se fosse também a sua primeira.
- Ha ha ha, é capaz de ser verdade. Isto é um instante, não custa nada. Eu dessas vezes todas só houve 5 ou 6 em que o avião tremeu de tal forma que eu cheguei a pensar que ia morrer.
- Esta conversa está a fazer com que eu fique muito mais calmo. Obrigado.
- Ha ha ha, desculpe lá, ao menos vai distraído.
- Quando isto for a cair então depois faça umas palhaçadas e uns pinos para eu não prestar atenção às asas em chamas e às pessoas a gritar, se faz favor.
- Combinado, bem naquela hospedeira ali é que eu lhe despenhava o meu Boeing, até ficava uma cratera! Ha ha ha!

Classe. Bem, a viagem lá se foi fazendo sem grandes sobressaltos e passadas 2 horas o comandante diz que estamos a chegar. O voo era para demorar 2.40h o que me fez pensar que aquele cabrão tinha vindo a abrir. Já o imagino, qual taxista no cockpit, a dizer "Ó Antunes, vamos antes por um atalho que se apanha menos trânsito e não há bófia, podemos meter prego a fundo que quem paga o jet fuel é a empresa". No entanto, apesar de termos chegado antes do tempo não aterrámos logo, ficámos ali uns 30 minutos numa espiral descendente e eu só pensava "Olá.... tu queres ver que não temos trem de aterragem...!" 

íamos andando ali às voltas, como se faz nas rotundas quando ninguém tem a certeza para onde é o caminho. 

Lá percebi que devíamos estar à espera de autorização para aterrar e quando ela nos foi dada lá se mandou o avião para as profundezas que para piorar estavam com nevoeiro. Eu ia à janela e só pensava "O gajo vai a abrir, não se vê a pista!" e nisto vejo a pista a aparecer e o avião a aterrar suavemente até parar. Não bati palmas porque não sou palerma mas por dentro todo eu era euforia. Só não estava totalmente descansado porque sabia que daí a uma semana teria que passar pelo mesmo suplício. Nessa noite, para piorar as coisas, já vos contei que houve um gajo que me tentou violar.

Bem sei que a maioria não compreende este medo e eu adorava meter-me num avião com a descontracção com que me meto num comboio sem sequer pensar que aquilo pode descarrilar e fazer-me em picadinho fundido com chapa. Dizem que 1 em cada 3 pessoas tem medo de andar de avião, por isso acredito que haja por aí quem me compreenda. Mais depressa passeio na Buraca à noite todo nu com um relógio de ouro na pila a gritar "Ninguém tem coragem de me roubar o meu bling blig peniano!", do que me meto descontraído num avião. Não concordo que se diga que é um medo irracional porque só o seria se nunca ninguém tivesse morrido de avião. Eles caem. Há quem morra. Não é irracional pensar que o nosso vai cair. É só pouco provável. Aliás, quem não tem medo é egoísta, porque está a assumir que isso só acontece aos outros. No fundo é isso, eu não tenho medo de andar de avião, sou é altruísta e extremamente boa pessoa. 

Como disse no início, enquanto lêem este texto eu posso estar ainda no aeroporto, dentro do avião ou já ter chegado a Londres. Vou na TAP, que não está nos melhores dias e que tem pilotos descontentes. Deixei uns quantos textos agendados para amanhã e quarta-feira, por isso se eu falecer não é o meu fantasma que está a aceder ao Facebook no portátil de Jesus no além. Só para que fique esclarecido.

PS: Se o meu avião cair tenho a certeza que este texto vai ficar viral, por isso não sejam macabros e partilhem mesmo que eu continue vivo.




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