Eu sou do tempo em que a televisão servia, também, para nos fazer rir. Nos dias de hoje, os únicos programas que nos fazem rir na TV são aqueles em que optamos por rir para não chorar a sua podridão. Lembro-me de esperar ansioso pelo dia da semana que dava o Herman Enciclopédia, de gravar os programas em VHS que tinha pedido ao meu pai para comprar, e que via e revia cada um dos sketchs até lhes saber as falas de cor para os tentar imitar para os meus pais e para os meus amigos. Lembro-me que havia sempre um ou mais programas de humor na TV portuguesa, diariamente. Fosse o "Contra Informação", os talk shows do Herman, sitcoms como o "Fura Vidas" e até os "Malucos do Riso" e as várias aventuras do Camilo de Oliveira. Programas todos diferentes mas que tinham qualidade, fosse qual fosse o público (ou gosto) a que se destinavam. Lembro-me de ver a reposição do "Tal Canal" e lembro-me dos concursos que faziam questão de ter humor misturado, como o Parabéns ou outros do género. Quando só havia dois canais e depois, mesmo com os quatro, havia sempre espaço para humor e, curiosamente, havia público para ele. Na minha casa, os programas de humor sempre foram os que juntavam a família toda na sala. O humor é transversal e tem esse poder.
Hoje, a televisão prefere deixar os espectadores entretidos sem os fazer rir, até porque para rir é preciso pensar. Prefere apostar em novelas feitas ao quilo, a maioria com diálogos e enredos saídos de composições da alunos da primária, com muitos actores que sabem melhor desfilar do que representar. Talvez o texto que lhes dão não precise, ou mereça, melhor. As televisões preferem apostar nas maratonas de música pimba em playback com artistas duvidosos que vão lá a troco de nada, na esperança de lançar uma carreira, enquanto vão vendendo um sonho aos velhotes em forma de número de telefone. Fazem-se reality shows em série e concursos de talento, que não passam de concursos de popularidade, com a fasquia tão baixa que se fosse o jogo do limbo ninguém conseguia ganhar.
No outro dia vi um programa de humor na televisão. Era um programa de apanhados estrangeiros, com risos enlatados. A sério? É isto o melhor que conseguimos? É preciso irmos à loja dos trezentos do riso buscar este tipo de programas quando temos por cá quem tão bem nos faça rir? É triste. Sou do tempo em que ao menos importávamos qualidade: "Sai de Baixo", "Mr. Bean", "Benny Hill", entre tantos outros geniais. Agora apanhados manhosos que há canais no Youtube mil vezes melhores feitos sem orçamento por dois gajos e um smartphone? Poupem-me. Sim, temos o Canal Q e a SIC Radical que ainda apostam no humor, mas não é suficiente. Desde os Gato Fedorento que não há nenhum que transite para a TV generalista e se lhe dê a oportunidade de chegar a mais pessoas. Há quem diga que é porque não há humor português de qualidade, eu acho que é porque não há espaço para que ele cresça e chegue a esse patamar.
E o humor onde anda?
No outro dia vi um programa de humor na televisão. Era um programa de apanhados estrangeiros, com risos enlatados. A sério? É isto o melhor que conseguimos? É preciso irmos à loja dos trezentos do riso buscar este tipo de programas quando temos por cá quem tão bem nos faça rir? É triste. Sou do tempo em que ao menos importávamos qualidade: "Sai de Baixo", "Mr. Bean", "Benny Hill", entre tantos outros geniais. Agora apanhados manhosos que há canais no Youtube mil vezes melhores feitos sem orçamento por dois gajos e um smartphone? Poupem-me. Sim, temos o Canal Q e a SIC Radical que ainda apostam no humor, mas não é suficiente. Desde os Gato Fedorento que não há nenhum que transite para a TV generalista e se lhe dê a oportunidade de chegar a mais pessoas. Há quem diga que é porque não há humor português de qualidade, eu acho que é porque não há espaço para que ele cresça e chegue a esse patamar.
O último programa de humor que esteve na TV foi o "Melhor que falecer" do Ricardo Araújo Pereira. Muito do público, habituado a consumir humor, criticou e disse que não tinha piada. A essa hora, agora, temos uma novela e ninguém critica. As pessoas são mal agradecidas e parece que se esqueceram de rir. Já nos passou o frenesim pós 25 de Abril em que quisemos rir tudo aquilo que não nos deixaram no tempo da outra senhora. Quisémos rir sem limites, sobre política e religião, rir ao máximo para mostrar que nos conseguimos libertar das amarras da ditadura. Novos e velhos, mais cultos ou mais brejeiros, mais básicos ou mais elaborados, havia humor para todos. Havia riso para todos. Com o Levanta-te e Ri apareceu uma fornada de novos comediantes, muitos dos que são os melhores de agora. Durou e durou, era líder de audiências no horário dele mas era caro a fazer. Matou-se o programa e nunca mais voltou. Era um programa importante não só pelo que fazia rir, mas pelo futuro que dava ao humor português.
Fazer rir devia ser serviço público.
Mas a RTP parece que não é da mesma opinião. É pena. Fazer rir é dos maiores serviços que se pode prestar aos cidadãos. Não dá audiência? Temos pena. Façam rir quem quer e quem precisa. Preferem noticiários de hora e meia com notícias de encher chouriços? Ridículo. Sim, há o "5 Para a Meia Noite" com alguns momentos de bom humor mas não é a mesma coisa, e passa tarde. Sim, apostaram no "Último a Sair" e na "Odisseia" do Bruno Nogueira mas soube a muito pouco. Eram ambos demasiado bons para não merecerem mais destaque e, claro, mais uma vez, houve pessoas a refilar que não tinham piada. Agora, a essa hora, temos novelas desenxabidas e ninguém diz nada.
Uma vez, estava eu preso no trânsito da 2ª Circular, segunda-feira por volta das 9h da manhã, num pára-arranca infernal com mais de meia hora para fazer dois ou três quilómetros. Estava a ouvir a Mixórdia do Ricardo Araújo Pereira e olhei à volta, para as caras dos outros condutores: estavam todos sorridentes, o que era de estranhar naquela situação, e riam-se ao mesmo tempo, muitos sozinhos no carro, numa gargalhada abafada pelas janelas, motores e buzinadelas. Percorri todos os carros com o olhar, os que estavam a ir para Lisboa e os outros, no sentido contrário, e quase todos se estavam a rir alto e ao mesmo tempo. Estavam todos a ouvir o mesmo que eu e, naqueles cinco minutos, o trânsito deprimente de uma manhã de segunda-feira teve menos peso para todos. Tudo porque um "palerma" estava a dizer umas piadas na rádio. É este o poder do humor. Faltam-nos rir assim, todos em conjunto, porque não são só as manhãs a caminho do trabalho que precisam de ser aliviadas.
Há pessoas que adoram criticar os humoristas como não o fazem a um actor, um cantor, um apresentador ou qualquer outro interveniente no entretenimento. "Aquele é muito brejeiro!", "aquele plagia piadas!", "aquele é muito negro!", "aquele perdeu a piada!", "aquele vendeu-se à publicidade!", "aquele pensa que é engraçado!", aquele isto e aquele aquilo. Eu compreendo, ver alguém ter mais graça que nós é lixado e desperta invejas. Toda a gente sabe que as mulheres adoram homens com sentido de humor, o que faz com que de cada vez que vemos alguém que tem mais graça do que nós, seja como se estivéssemos a tomar banho com todos os jogadores pretos da NBA. Sentimos a nossa masculinidade afectada e precisamos de lhes por defeitos e desejar que eles tenham disfunção eréctil ou ejaculação precoce. A inveja é fodida e é uma das razões pelas quais não há mais espaço para o humor em Portugal. Inveja por parte do público e, claro, dos humoristas uns pelos outros. Perde-se demasiado tempo a falar dos limites do humor quando ele apenas devia ser discutido pela quase qualidade. Humor ou é bom ou é mau e mesmo o mau serve um propósito e, digo eu, mais vale ter mau e ir melhorando e deixando o público escolher, do que não ter nenhum. As pessoas preocupam-se mais em que ninguém se ofenda do que em que alguém se ria.
Ser humorista implica ser-se bom no que se faz. Um actor é um bom ou mau actor, um professor é um bom ou mau professor e um médico pode ser um bom ou um mau médico. Ser humorista é a única profissão que tem na sua palavra a obrigatoriedade de se ser bom. Se alguém escreve um texto ou sobe a um palco e ninguém se ri, então não é um humorista, é apenas alguém que que escreveu ou disse umas coisas sem piada. Talvez seja essa pressão que leve também as pessoas a criticar os humoristas. Acho bem que critiquem mas é sempre um pau de dois bicos, o que não tem piada para uns, tem para outros e, se o público gosta e se ri, é porque é válido e tem valor. Rir talvez seja das poucas coisas que, inequivocamente, nos diferencia do resto dos animais e, pelo estado irracional do mundo, talvez nos falta puxar por essa faceta Humana.
A ofensa é um efeito secundário do humor e, tal como nos medicamentos, não é pelos efeitos secundários que o médico deixa de os receitar.
Ser humorista implica ser-se bom no que se faz. Um actor é um bom ou mau actor, um professor é um bom ou mau professor e um médico pode ser um bom ou um mau médico. Ser humorista é a única profissão que tem na sua palavra a obrigatoriedade de se ser bom. Se alguém escreve um texto ou sobe a um palco e ninguém se ri, então não é um humorista, é apenas alguém que que escreveu ou disse umas coisas sem piada. Talvez seja essa pressão que leve também as pessoas a criticar os humoristas. Acho bem que critiquem mas é sempre um pau de dois bicos, o que não tem piada para uns, tem para outros e, se o público gosta e se ri, é porque é válido e tem valor. Rir talvez seja das poucas coisas que, inequivocamente, nos diferencia do resto dos animais e, pelo estado irracional do mundo, talvez nos falta puxar por essa faceta Humana.
As gerações mais novas têm a opção de ir buscar à Internet o seu riso. E vão! Não é por acaso que se multiplicam os canais de de Youtube virados para humor, estrangeiros e portugueses, que há páginas de Facebook e blogues carregados de humor, bom e mau. Que há um 9gag, uma das maiores plataformas de humor feito por todos, que tem uma afluência gigante e especialmente malta mais nova. A proliferação do riso na Internet mostra que as pessoas se querem rir. Se calhar, está na altura das TVs voltarem a ter tomates e apostar nisso antes que nos passem as ganas de mostrar os dentes.
Foi um lusco-fusco da liberdade de expressão, da qual o humor precisa para crescer. Agora já passou, ser Charlie já passou de moda e já voltámos à nossa condição humana de nos rirmos ou ofendermos com punchlines iguais, mas em que a premissa é diferente e não nos toca a nós. Devem estar a pensar que eu estou a puxar a asa à minha sardinha, mas nunca me ouviram dizer que sou humorista, sou um Engenheiro Informático que tem como hobbie escrever coisas. Às vezes com piada, às vezes sérias. Faço stand up comedy de vez em quando porque gosto e porque me ocupa os tempos livres. Dizer que sou humorista seria o mesmo que dizer que sou futebolista por jogar à bola, de vez em quando, com os amigos. Talvez um dia o seja, mas ainda não. No entanto, sempre gostei de me rir e sempre gostei de fazer rir os outros. O humor começou a fazer parte da minha vida quando me ofereceram um livro do Calvin and Hobbes, tinha eu dez anos, por pensarem que era um livro para crianças. Um tio viu e disse aos meus pais "Não o deixem ler isso tão novo, vai ficar com um sentido de humor cáustico, irónico e insuportável.". Acho que ele tinha razão. E é por o humor sempre ter feito parte da minha vida que me faz confusão que não se aposte nele como se fazia antigamente. A minha geração, no recreio da escola e no café com os amigos, repetia os chavões dos nossos heróis do riso. Era comum ouvir-se "Onde é que tu estavas no 25 de Abril?", "Não havia necessidade?", "Falam, falam, falam...", "Olhó kunami fresquinho!", "Cabecinha pensadora!", "A vida costa!" e até um "Lá fora tass pior, tass tass, tassss!". Hoje, a única frase emblemática que as novas gerações ouvem na televisão é "Ligue já o 760 20 60 20!". É triste.
Há pouco tempo houve uma vontade grande de rir: foi quando fomos todos Charlie, ali naquela semaninha, não sei se se lembram.
Foi um lusco-fusco da liberdade de expressão, da qual o humor precisa para crescer. Agora já passou, ser Charlie já passou de moda e já voltámos à nossa condição humana de nos rirmos ou ofendermos com punchlines iguais, mas em que a premissa é diferente e não nos toca a nós. Devem estar a pensar que eu estou a puxar a asa à minha sardinha, mas nunca me ouviram dizer que sou humorista, sou um Engenheiro Informático que tem como hobbie escrever coisas. Às vezes com piada, às vezes sérias. Faço stand up comedy de vez em quando porque gosto e porque me ocupa os tempos livres. Dizer que sou humorista seria o mesmo que dizer que sou futebolista por jogar à bola, de vez em quando, com os amigos. Talvez um dia o seja, mas ainda não. No entanto, sempre gostei de me rir e sempre gostei de fazer rir os outros. O humor começou a fazer parte da minha vida quando me ofereceram um livro do Calvin and Hobbes, tinha eu dez anos, por pensarem que era um livro para crianças. Um tio viu e disse aos meus pais "Não o deixem ler isso tão novo, vai ficar com um sentido de humor cáustico, irónico e insuportável.". Acho que ele tinha razão. E é por o humor sempre ter feito parte da minha vida que me faz confusão que não se aposte nele como se fazia antigamente. A minha geração, no recreio da escola e no café com os amigos, repetia os chavões dos nossos heróis do riso. Era comum ouvir-se "Onde é que tu estavas no 25 de Abril?", "Não havia necessidade?", "Falam, falam, falam...", "Olhó kunami fresquinho!", "Cabecinha pensadora!", "A vida costa!" e até um "Lá fora tass pior, tass tass, tassss!". Hoje, a única frase emblemática que as novas gerações ouvem na televisão é "Ligue já o 760 20 60 20!". É triste.
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