29 de junho de 2017

Férias, amores de verão e festas de espuma - Podcast #12



No episódio de hoje do podcast Sem Barbas Na Língua, falamos sobre as férias e damos várias dicas para umas férias bem passadas e sem violações indesejadas como me ia acontecendo em Londres. A conversa passa por modelos de Instagram, decotes, festas da espuma, silly season, cocós de cães e muito mais. É ouvir e, se gostarem, subscrevam e partilhem.



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28 de junho de 2017

Juntos Por Todos, Peidar Pelos Dois



O mundo tornou-me um cínico. Estava a ver o concerto solidário «Juntos Por Todos» e só pensava que aquilo era uma premissa excelente para um episódio do Black Mirror: transformar a solidariedade em entretenimento. Ajudar os outros fazia-te ganhar pontos que depois podias usar para descontos no supermercado ou assim. Angariou-se mais de um milhão de euros e há quem olhe para isto e veja o copo meio cheio e que é lindo ver que nos unimos em alturas de catástrofe. Eu, meio cínico, meio idealista frustrado, olho para isto com essa sensação, mas, também, com a de «Afinal até conseguíamos mudar o mundo se quiséssemos só que nos estamos a cagar porque a mudança do mundo não passa na televisão.». Se, ao menos, ao lado de cada sem-abrigo houvesse uma câmara a transmitir em directo para todos os canais e tu pudesses ir lá ajudar, mandar props para o teu pessoal da Régua e ligar para a tua mãe a dizer que estás na TV, a coisa seria diferente. Se, ao menos, os sacos do Banco Alimentar contra a fome tivessem uma app integrada que te permitisse partilhar automaticamente no Facebook com quanto quilogramas de comida é que acabaste de ajudar, a coisa seria diferente.

Pensei, também, em qual será a diferença entre fazer uma piada com uma tragédia ou cantar e dançar alegre ao som de uma música num concerto com uma tragédia em pano de fundo, especialmente com músicas «Anda comigo ver os aviões» que só se fosse para os contar e termos a certeza de que não caiu nenhum antes de lançar notícias. Nenhuma diferença: ambas servem para sacudir o medo da nossa própria desgraça. Claro que o momento da noite não foi a união entre as pessoas nem o dinheiro angariado para ajudar as vítimas, mas sim o que o Salvador Sobral disse. As pessoas têm um dom de passar do mood de solidariedade para o mood de ódio nas redes sociais em menos de dois segundos. As pessoas, quando é para dizer mal, têm um motor mais potente do que um Ferrari e um arranque mais rápido do que um Tesla com a diferença de que emitem gases nocivos ao ambiente sempre que abrem a boca. O rapaz fez, ou tentou fazer, uma piada e disse a palavra peido! Uhhh, que falta de chá! Pelo que ouvi o público riu-se bastante, o que valida a piada, seja boa ou má aos nossos olhos. Tenho para mim que as pessoas que ficaram indignadas com ele são as mesmas que ficam preocupadas com o destino do dinheiro angariado sem terem contribuídoVi mais gente ofendida com isto do que com o Passos Coelho a lançar boatos sobre suicídios.

Parece que os artistas têm de ser mais politicamente correctos do que os políticos têm de ser correctos.

As pessoas têm todo o direito de achar inconveniente aquele comentário e de não terem gostado, atenção, o que não percebo é a prontidão com que vão para o Facebook despejar o seus carregadores cheios de munições de frustração apontando as suas armas que parecem ter as miras desniveladas, já que escolhem sempre os alvos errados. Parece que estão a ver um evento solidário sempre à espera do momento para se ofenderem como se ser solidário lhes estivesse a consumir todas as forças e precisassem de uma dose de indignação para curar a ressaca. A mim ofende-me mais quem tem uma fotografia a dizer luto e que tendo possibilidade de ajudar, escolheu não dar um único euro porque dava muito trabalho. Aquilo pode ter sido só uma piada ou pode ter sido uma crítica disfarçada de piada já que antes ninguém ligava ao rapaz e agora tudo o que ele faz é considerado genial e, sim, se ele fizesse um álbum a tocar trompete com o cu as pessoas, nesta altura, compravam na mesma. Como artista, isso deve ser triste ver que a tua qualidade interessa menos do que a tua popularidade. Era o momento ideal para fazer essa crítica ao público? Talvez não, mas que mal vem daí ao mundo? Ao menos ele ajudou doando dinheiro e com o seu trabalho. É o momento certo para, a meio de um concerto solidário, se estar na Internet a dizer que ele estragou o evento no qual ele ajudou a angariar mais de um milhão? Acho que nenhuma das vítimas vai estar preocupada se o dinheiro vem com ou sem molho.
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27 de junho de 2017

Estou velho: fiz um cruzeiro aos 30 anos



No verão passado fiz um cruzeiro. Na altura não me apeteceu escrever sobre isso, mas agora vou contar-vos essa experiência. Para efeitos de não levar com processos em cima, não vou dizer qual foi a empresa. Foi assim tão mau? Não, mas gosto de dizer mal de tudo e, na verdade, foram um bocado aldrabões. Comecemos pelo início porque não vale a pena uma narrativa não linear para vos contar esta história. Poder-me-ia armar em David Lynch, mas acho escusado.

Foi daqueles cruzeiros mais baratos, 8 dias no Mediterrâneo, marcado por impulso na Internet porque já havia pressões externas, vulgo namorada, a dizer que já estava muito em cima para se marcar férias. Iríamos os dois e, sendo ela uma princesa como quase todas as mulheres, sou sempre eu que trato de tudo e, por isso, desta vez, precisava de férias daquelas que se mete uma pulseira e não se tem de conduzir, nem escolher restaurantes nem hotéis e com empregados em todos os cantos que tratam de nós.


Sendo que ir passar férias para uma plantação de café no tempo da escravatura estava esgotado, o cruzeiro pareceu-me o mais adequado.

Isso e porque um cruzeiro é excelente desculpa para alguém que, como eu, tem medo de andar de aviãoQuando disse que foi daqueles baratos, isso era o que pensava inicialmente, mas já lá vamos. Depois de comprar os bilhetes e de ir para Barcelona de comboio porque avião é para quem gosta de facilidades e não sabe esperar pelas coisas, lá chegámos ao porto de embarque. Navio grande e imponente, com muitas janelinhas pequeninas, especialmente as dos quartos em baixo que seriam os nossos porque, lá está, eram os mais baratos. Ao fazer o check-in percebi que onde há preconceito há fogo e que aquela ideia de que os cruzeiros estão cheios de pessoas na última volta da vida, é, de facto, verdade. Muitas cabecinhas grisalhas com chapéus de palha a arrastar malas que se não tivessem rodas só conseguiam levar uma muda. Depois de uma hora à espera, lá fizemos o check-in e foi nessa altura que nos pediram para pagar as gratificações dos empregados. Noventa euros por pessoa, vai buscar. Eu que nunca dou gorjetas, estava ali a ser extorquido por uma senhora vestida à capitão Iglo. Reclamei:

- Pero, gratificaciones só lo se paguien dan lo finale de la viaje despues de lo servicio sere bueno, no? Si o que? - disse eu no meu castelhano irrepreensível que aprendi a ver o Narcos.

A senhora não foi na conversa e, ao que parece, é obrigatório e estava naquelas letras pequeninas do contrato. Na verdade, já sabia, mas achei que era giro começar as férias indignado e mostrar que a alma lusitana que expulsou os espanhóis ainda está viva! Paguei, enquanto resmungava calão em português, mas a partir daquele momento incumbi-me da missão de dar despesa ao cruzeiro, fosse no bar aberto ou nos buffets. Subimos as escadas para o navio e mal se entra esquece-se que se está num barco: aquilo é um hotel flutuante! De duas estrelas, mas um hotel. Descemos as escadas até ao nosso quarto que era uma espécie de caixão com cama de casal e janelinha demasiado rente ao nível da água. Era, claramente e em gíria automóvel, o lugar do morto, a não ser num evento improvável de o barco ficar virado ao contrário e mesmo assim, vai lá sair pelo casco a ver se consegues. Bem, deixámos as coisas e vamos fazer aquilo que nos trouxe aqui: ficar a beber no bar e a abanar o pulso, estilo Roque Santeiro, para o empregado ver a pulseirinha e nos tratar como mestres senhoriais. Todos os empregados eram simpáticos, sempre de sorriso rasgado e a fingir muito bem que estavam mesmo interessados no nosso bem estar. Talvez fossem sinceros, já que as gorjetas já as tinham no bucho, os lambões. A primeira noite foi de tempestade: deitado na cama sentia-me como naquelas noites em que um gajo se deita ainda bêbado e sente que está num barco. A diferença é que ali estava mesmo num barco e sentia o sangue a acorrer-me à cabeça e, depois, a descer consoante as ondulações. Sentia as ondas a bater na janelinha e à primeira vista parecia que estava num submarino, mas lá adormeci, embalado por Poseidon e por Johnnie Walker.

O segundo dia foi todo passado em alto mar a caminho da primeira paragem. A tempestade já tinha ficado para trás e o bom tempo convidava a banhos na piscina. Piscina essa que era demasiado pequena para aquela gente toda e havia sempre aquela típica dança das espreguiçadeiras em que o pessoal armado em esperto ia deixar as toalhas antes de ir tomar o pequeno-almoço para reservar lugar. Nada que atirar a toalha para o chão e levar a cadeira para outro sítio não resolvesse. Há sempre quem seja mais esperto! A piscina estava mais lotada do que uma carrinha de ciganos, mas ia dando para molhar os pés. 


O pior eram os jacuzzis que estavam sempre, mas sempre, cheios pessoas pequeninas e nojentas: crianças.

Dizia lá para o pessoal não usar mais de dez minutos, mas todos sabemos que as crianças são gentalha que faz o que lhes apetece. Quando saiam de lá ficavam por perto aos gritinhos impossibilitando o relaxamento para o qual as banheiras com bolhas foram criadas. Com tanta confusão teria sido demasiado fácil afogar duas ou três crianças sem que dessem conta. Depois era chamar o empregado para recolher os corpos e trazer mais um Piña colada. Foi aqui, na piscina, que percebi a quantidade de gente feia que ali se tinha juntado. Não tenho problemas em dizer que eu e a minha namorada éramos as pessoas mais bonitas daquele cruzeiro. As menos feias, no meu caso. Senti-me como uma modelo da Victoria Secret a desfilar na Clínica Tallon. Só gente feia, muitos sem dentes e não me venham com tretas de possibilidades para arranjar a cremalheira porque entre um cruzeiro e um pivot, digo-vos que a minha prioridade seria o segundo.

Tínhamos de acordar cedo para tomar o pequeno-almoço e ir passear. Era aqui que, mais uma vez, se notava que havia gente a mais naquele barco, já que as filas para o pequeno-almoço eram consideráveis. Na frente, estavam sempre aqueles casais de gordos, que chegam ao final das férias de verão com o interior das coxas todo assado, a salivar e raspar a pata no chão como touros antes de entrar na arena. Mal abriam as portas, iam a correr sentar-se nos lugares mais perto do buffet para conseguirem tirar mini crepes de chocolate sem se levantarem. O pessoal nos campos de refugiados vai buscar comida de forma mais ordeira, mas é compreensível já que os refugiados não pagaram. Aposto que era por causa destes animais que os quartos eram arrumados e os lençóis eram trocados duas vezes ao dia. Eram estes javardos que deviam ficar o dia a comer nachos na cama enquanto os passavam pelo umbigo que servia para recipiente para o molho. A comida do pequeno almoço era de hotel de três estrelas, razoável, e como todos os dias passávamos a tarde fora nas cidades, era preciso um plano para não se gastar ainda mais dinheiro, já que este menino não vai estar a comer pizzas por 30€ em Itália. Aprendam como se faz: levar vários pães, fiambre e queijo para a mesa, fazer várias sandes, enfiar nuns sacos de sandes previamente levados para esta finalidade, e encher a mala da namorada até ficarem sandes a espreitar. Há quem lhe chame ser pobre, eu chamo-lhe ser inteligente. Não me importo de gastar dinheiro, desde que o tenha e que seja em coisas que valem esse valor. Um café, só porque estou em Roma, não passa a valer 4€. Já me tinha bastado perceber que tinha sido enganado nas gorjetas e, pior, nos portos das cidades. Quando diz no Cruzeiro que pára em Roma, eu, não percebendo muito de geografia, estou à espera que o barco atraque à porta do Coliseu e não que o porto seja a uma hora e tal de viagem de autocarro. Imaginem o que seria os estrangeiros que fazem cruzeiros a Lisboa pararem em Peniche. «Is this Lisbon? No, it's Pénis.», diriam. O pior é que esses transfers não estão incluídos no preço. Ah pois, vai buscar mais 40€ por pessoa na paragem em Roma e também em Florença.

Voltemos ao cruzeiro em si. A animação na zona da piscina era sempre variada: variava de muito má para merda. Para além de dez músicas espanholas antigas a passar em loop, fazendo lembrar a minha viagem de finalistas a Lloret del Mar, havia momentos de, chamemos-lhe, humor. O staff fazia umas danças e uns jogos, mas claramente tinham mais jeito para preparar gins. Houve um que era a recriação dos jogos olímpicos com pessoal vestido de ciclista e de acrobata e com bandeiras de vários países e devo dizer-vos que parecia um musical do La Féria, mas ainda em pior. Era mau. Muito mau. Era como ver circo com 30 anos. Até fiquei com pena deles e a achar que mereciam aquelas gorjetas obrigatórias. Deprimente e muita vergonha alheia em que só as crianças mais pequenas e atrasadas em termos de desenvolvimento intelectual é que achavam interessante. Até no lar de terceira idade onde a minha namorada é directora, ou em termos técnicos «repositora de stock de velhos», a animação é melhor. Se foi para aquilo que as minhas gratificações foram canalizadas, ainda maior roubalheira foi. Por falar em vergonha alheia, o cruzeiro tinha uma discoteca, mas que estava sempre às moscas. Os velhos dormem cedo e os gordos têm de acordar a tempo para abrir a pista do buffet, o que deixava 90% da população do cruzeiro fora desta equação. Fomos lá algumas vezes ver o que se passava e o cenário era o semelhante a uma discoteca normal em fim de noite: os tristes que pensaram que ir para aquele cruzeiro engatar alguém era uma boa ideia. Homens com esperança de que o facto de uma mulher estar presa num barco e com bar aberto fosse o suficiente para baixar os padrões e irem com eles para o quarto. Vi uma dança de acasalamento incrível, como se estivesse a ver um grupo de suricatas do Serengeti a tentar acasalar com dois antílopes. Um rapaz, esforçou-se durante uma hora, a tentar convidar a rapariga para dançar, a falar-lhe ao ouvido, a ir buscar-lhe bebidas - que neste caso nem servia de muito porque o bar era aberto - e nada. Nisto, quando o rapaz foi buscar o quinto safari cola à menina, na esperança que de que o álcool fosse o seu wing man, vem outro gajo meter-se com ela: cinco minutos e estavam a comer-se na pista. Nunca me hei de esquecer do olhar triste do rapaz, a vir do bar com duas bebidas na mão, ao ver aquele espectáculo de mamanço da boca. Estão a ver a cara de uma chita bebé quando vem uma leoa e lhe rouba a carcaça de gnu? Foi isso.


Foi como observar uma mãe foca a ver a sua cria a ser engolida por uma orca e não poder fazer nada para ajudar porque a natureza é assim: bela na sua crueldade.

As cidades estão para um cruzeiro como as bandas estão para um festival de verão: não interessam muito. No entanto, aqui fica um pequeno resumo das paragens:
  • Olbia - É uma espécie de terriola algarvia, mas com água mais quente.
  • Nápoles - É uma cidade bonita, fomos a Pompeia de comboio suburbano e digo-vos que a linha de Sintra ao pé daquele percurso de 50 minutos parecia a Quinta da Marinha.
  • Roma - Fila de três horas para entrar no Coliseu? Temos pena, não vai dar para mim. Fomos ao Vaticano e a minha namorada foi barrada por estar vestida à rameira, segundo o dress code sacro. Já escrevi sobre isso neste texto.
  • Florença - Uma cidade muito bonita, pagámos 15€ para passar à frente da fila de três horas para ver lá a Igreja ou o caraças. Comi um gelado que me custou 10€. Tal como o mundo em geral, o único problema é ter demasiadas pessoas.
  • Toulon -Um cruzeiro fazer paragem em Toulon é o mesmo que um avião fazer escala de quatro horas no Cacém. Aquela ideia do «quatro horas nem dá para visitar nada!» é uma vantagem. Ainda assim, fomos à praia que não era má excepto a areia e as pessoas. A sério, nunca vão a Toulon. É tipo Quarteira depois de uma guerra.
Com isto tudo, faria novamente este cruzeiro? Sim. Foi giro, eu é que tenho um dom especial para dizer mal de tudo. Vim cansado de tanto andar, com peso a mais de tanto comer, e com tonturas e vertigens durante um mês o que, pelo que vi no Google, é comum e chama-se Síndrome do Marinheiro. Como bom hipocondríaco que sou, também é possível que fosse um tumor cerebral, mas como ainda não morri e já passou um ano, devo estar safo.
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25 de junho de 2017

A bonita tradição dos touros de fogo



Portugal sempre foi um país que valorizou as suas tradições. Desde o fado ao cante alentejano, o português é um povo que em toda a sua auto maledicência consegue valorizar as lembranças de um passado glorioso, em forma de tradições. É incrível como é que nós, novas gerações, muitas vezes, nem conhecemos as bonitas tradições do nosso país. Por exemplo, foi apenas há dois anos que tive conhecimento dessa bonita tradição portuguesa de queimar gatos vivos num recipiente de olaria nacional, e foi apenas este fim de semana que descobri a bonita tradição de pegar fogo aos cornos de touros. Sou um ignorante no tocante à cultura portuguesa, bem sei. Aconteceu em Benavente, apesar de ter sido anunciado previamente e proibido logo em seguida. Jornalistas e activistas da causa animal foram ameaçados por alguns populares de Benavente, mostrando que eles afinal são pela igualdade e que tanto agridem touros como pessoas. Ao menos isso, as pessoas também merecem apanhar com bandarilhas! A GNR, ao que parece, viu e não fez nada porque estavam a beber uma mini e não dá jeito tomar conta de ocorrências só com uma mão. Também não sei porque é que é proibida uma tradição tão linda que só torna a tradição da tourada ainda mais luminosa! Espetar ferros tudo bem, incendiar chifres não? Disparate. Se é para se ser burgesso, que se seja em grande! Se eu fosse adepto de tortura animal, colocava estalinhos nos cascos do touro para ele andar aos saltinhos feito cabra montesa, colocava uma motosserra presa à cauda do bicho para ele se cortar todo e os homens valentes que rabejam serem ainda mais corajosos e másculos! Tenho boas ideias, mas sinto que é estar a dar pérolas a porcos, não querendo ofender os porcos.

Sinto que já disse tudo o que tinha a dizer sobre touradas quando escrevi este texto, tanto que nunca mais falei no assunto. No entanto, esta notícia mereceu a minha atenção até porque vivemos num mundo onde não se pode dizer que as pessoas são más, apenas que têm um problema ou que tiveram uma infância difícil. Por isso, estou preocupado com este grupo de pessoas de Benavente, que quero acreditar serem a minoria da terra: esta gente que gosta de ver touros presos a espernear enquanto um grupo de chimpanzés com ténis lhes pegam fogo tem algum tipo de problema mental. Gostar de ver violência contra animais só porque é tradição demonstra que há ali qualquer coisa naqueles cérebros que está queimada. Talvez tenham assistido demasiado perto da última vez e o calor lhes tenha derretido os apoios do cérebro, não sei.

Não sei se foi a mãe deles que fumou e bebeu durante a gravidez ou se o pai desta gente é ao mesmo tempo primo em 2º grau.

Sei que a explicação mais consensual é que a exposição a este tipo de barbárie desde pequenos lhes tenha atrofiado ali a parte do cérebro responsável pela empatia com animais. Talvez seja isso. Cá para mim são só burros e ignorantes: no caso dos homens, com inseguranças penianas; no caso das mulheres, mal fodidas devido à pequenez de carácter e de pila dos seus homens.

O que me choca não é haver gente que gosta disto porque isso vai sempre existir: ainda há gente com nostalgia da escravatura, por exemplo. O que me choca é ser permitido ou, pior, ser proibido e fazer-se na mesma, e ninguém ser responsabilizado. É que a mim também me apetecia quebrar a lei e enfiar uma tocha a arder no cu desta gente e soltá-los na rua feitos pirilampos de Chernobyl, mas já sei que depois a polícia me vem bater à porta a pedir explicações. Por isso, fico-me por lhes chamar filhos da puta.
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23 de junho de 2017

Incêndios, cadáveres e pseudo feministas - Podcast #11



No episódio de hoje do podcast Sem Barbas Na Língua, falamos sobre o tema quente do momento, passe a expressão: os incêndios em Portugal. Falamos sobre o frenesim dos media e a cultura da tragédia alheia e do cadáver amestrado da Judite. Ainda há tempo para a rubrica «Coisas que nos fazem comichão» onde falamos sobre pseudo feministas e restaurantes sem higiene. Peço desculpa pelo som que desta vez ficou manhoso. Que não seja por isso que deixem de ouvir e, se gostarem, subscrevam e partilhem.



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21 de junho de 2017

Pesadelo numa Repartição das Finanças



Bem sei que ainda só se fala sobre os incêndios, mas eu também tenho desgraças na minha vida quase tão graves e que precisam da vossa atenção. Ontem, passei o dia nas Finanças. Ontem, que foi o dia mais longo do ano, decidi utilizar todas essas horas de sol para me enfiar em repartições das Finanças. Sim, repartições, plural, mas já lá vamos. Digo-vos que já estive em funerais mais animados e, tal como nos funerais, não fui às Finanças por gosto, mas sim por necessidade que calculo ser a razão que leva toda a gente a colocar os pés numa repartição, seja cliente ou trabalhador. Acontece que submeti o IRS e parece que houve divergências, sendo que a palavra «divergências» dita pelo Estado quer dizer «Olha que nós temos sempre razão e provavelmente vais pagar multas e cenas.». Fui notificado para esclarecer essas divergências e, como bom cidadão que sou, fui logo, a correr, resolver a situação porque ficar a dever alguma coisa ao Estado é pior do que ficar a dever ao Pablo Escobar, com a diferença que a plata és tu que a tens de dar. Lá fui, de manhã, para as Finanças de Alvalade. Chego por volta das 10h, tiro a senha e calha-me o número da sorte 83. Olho para o monitor e vejo que ia na senha 40. Nada mau. Tudo o que seja não ter de dar a volta é bom.

Felizmente, as filas das Finanças ainda não são como as outras filas em que os velhos têm sempre prioridade, caso contrário, em Alvalade, a única forma de seres atendido era esperares até chegares a velho.

Faço aquele pequeno ritual de esperar uns 20 minutos e perceber a que velocidade é que aquilo está a andar. Vejo que, nesses 20 minutos, o número avançou até ao 45 e recorrendo-me dos imensos conhecimentos matemáticos que adquiri ao longo de oito anos de curso de engenharia, percebo, através de uma regra de três simples, que a este ritmo iria demorar, sensivelmente, duas horas e meia. Fui ao café, aos correios, fazer compras para o mês e li Os Maias duas vezes. Voltei, passada hora e meia, com medo de já ter perdido a minha vez mas, felizmente, ainda faltavam 20 números! Ufa, que alívio. Lá esperei, desta vez sentado ao lado de todas as outras pessoas que estavam ali com cara de enterro. Já a espera ia longa e eis que recebo o que me pareceu ser um sinal da existência divina: do 75 ao 82 ninguém se acusou para ser atendido. Tinham desistido ou falecido, seja como for, ainda bem. Ao ver o meu número no ecrã, levanto-me como se tivesse uma mola nos glúteos e tivesse feito bingo. Aproximo-me do balcão, digo bom dia e sento-me:

- Então parece que tenho umas divergências no IRS... - afirmo.
- Acontece, vamos lá ver isso então - diz a senhora, sorridente - dê-me o seu cartão do cidadão.
- Ora aqui está.
- Hum... não pode tratar das divergências aqui, tem de ser nas Finanças da sua zona. - diz-me.
- A sério? - pergunto, incrédulo.
- Pois, é Amadora Zona 3. - confirma.
- Não sabia... - digo como olhar de Bambi ao ver a mãe a morrer.
- Divergências é sempre na repartição da zona onde mora - diz como se fosse uma informação veiculada, diariamente, nos media.
- Pronto, ok, mas pode dar-me uma ideia do que é? - tento.
- Ah sim, podemos ver aqui. Não podemos é resolver. - diz.

Lá estive com a senhora a tentar perceber o que teria acontecido e ao que parece eram questões com as retenções na fonte de alguns recibos verdes. Nada de grave, mas o mais simples erro com o Estado pode significar ter de ir alugar o rabo para o Parque Eduardo VII para pagar as dívidas. Pelo que vi o erro não seria meu, mas sim de uma das entidades que me pagou. Menos mal, à partida. Descansei, agradeci, comi um rissol no café do lado e pus-me a caminho das Finanças da Reboleira.

Chego lá às 14h do dia 21 de Junho de 2017, mas parecia que tinha chegado no ano de 1980.

Pensei que o meu velhinho Clio, acabado de vir da oficina, fosse agora um DeLorean, por engano do mecânico, e me tivesse feito regressar ao passado distante onde há ventoinhas com fitas esvoaçantes em vez de ar condicionado, ecrãs CRT com protecção para os olhos, e pessoas que apenas utilizam o dedo indicador para teclar. Parecia que estava dentro de um episódio do Duarte & Companhia com a diferença de que agora já ninguém pode fumar dentro dos escritórios. De resto, tudo igual. Tal como existe o andar modelo na venda de imobiliário, aqui parecia ter encontrado a repartição museu, parada no tempo, resistente às intempéries e com alguns trabalhadores que pareciam fossilizados. Tiro uma senha, daquelas do talho porque o digital podia destoar e sai-me o número 29. Ia no 20 e celebrei por dentro ao achar que iria demorar pouco. Esqueci-me que estávamos em 1980 e que, como tal, 9 senhas equivaliam a 50, já que aqueles computadores precisam de ser reiniciados a cada operação de somar na calculadora do Windows. Ao ver aquele oásis perdido num mundo cada vez mais tecnológico, decidi recorrer ao meu telemóvel, mais potente do que todos aqueles computadores juntos, e tirar uma fotografia para ilustrar este texto que pensei logo em escrever. Sinto uns passos a aproximarem-se na minha direcção e oiço uma voz:

- Peço descupaaaa... o senhor estava a tirar uma fotografiaaaa? - diz uma senhora.
- Sim. - respondo.
- Sabe que não pode tirar fotografias aquiiii? - pergunta.
- Não, por acaso não sabia. - digo.
- Vou ter de pedir para apagar a foto, simmmm? - pergunta num tom desagradável.
- Sim, sem problema. - digo enquanto procuro na galeria de imagens.
- É que não pode tirar fotografias aqui... percebeuuuu? - pergunta no mesmo tom.
- Sim. Já apaguei. - respondo, mostrando-lhe o telemóvel.
- De certezaaaa...? - desconfia.
- Sim. - afirmo.
- Prontoooo... - diz enquanto se afasta.
Como podem ver pelo arrastar da última sílaba de cada palavra, ela utilizou um tom paternalista e arrogante. Há uma diferença entre dizer «Peço desculpa» e «Peço desculpaaaa....», enquanto se faz um sorriso falso.
- Não precisa é de ser arrogante, sabe? - digo, não me contendo.
- Desculpeeee? - diz, virando-se para trás.
- Que pode dar-me a informação e pedir para apagar sem ser arrogante. Não é preciso. - sorrio, ironicamente.
- Eu fui arroganteeee?!?!?!?! - muda o tom.
- Pareceu-me.
- Fui arrogante? Eu fui arrogante? - perguntando a toda a gente que lá estava sentada, à procura da aprovação. - Vê, ninguém acha que eu fui arrogante. - diz, depois de ninguém se manifestar contra nem a favor já que ninguém quer desautorizar a pessoa que a seguir as pode tramar com os impostos. É como arranjar stress com um empregado de mesa antes de sermos servidos ou com um cabeleireiro antes do corte. Foi pouco inteligente da minha parte, bem sei, mas não me contive.
- Pronto, se calhar eu fiz confusão. Está calor aqui e posso ter interpretado mal. - digo, a tentar desanuviar.
- Pois, deve ter sido. Se eu fosse arrogante tinha chegado aqui e tirava-lhe o telemóvel para apagar as fotografias! - diz ela, reacendendo a chama de um problema que já estava resolvido.
- Sabe que não pode fazer isso e isso não era ser arrogante, era ser parva até porque não iria conseguir tirar-me o telemóvel e podia aleijar-se.
- Humpf... - resmunga enquanto vira costas e vai embora.

Nisto, fico em modo de alerta à espera que aparecesse um qualquer agente da autoridade a tentar fazer-me um mata-leão. Comecei logo a rever as aulas de jiu jitsu, mentalmente, para me recordar das várias técnicas de inverter a posição, fazer uma chave de braço ao polícia e mamar-lhe da boca que, segundo me ensinaram, é a melhor técnica para acabar um combate. Ninguém que anda à luta está preparado para aquilo se transformar numa violação homossexual, anotem que pode dar-vos jeito no futuro. Bem, sanado o conflito, lá esperei uma hora até que sou atendido. Sento-me:

- Boa tarde, parece que tenho umas divergências no IRS. - digo.
- Ora vamos lá ver isso, diga-me o seu número de contribuinte e vamos lá ver o que é que se passa. - diz a senhora, sorridente.
- Pelo que vi nas Finanças de Alvalade tem a ver com uma entidade que não submeteu todos os recibos - advirto.
- Ah, já sabe? Então porque é que não tratou das divergências lá em Alvalade? - pergunta, confusa.
- Porque me disseram que tinha de ser aqui... - respondo.
- Porquê? - insiste.
- Porque disseram que tinha de ser na zona de residência... - digo.
- Não tem. Pode fazer onde quiser. - diz, para meu espanto.
- Ai é? Então ando eu aqui a perder tempo para nada?
- Pois, o colega lá de Alvalade não sabe nada, está visto. - brinca dizendo a verdade.
- Eu a pensar que eu é que era ignorante, afinal a senhora que me atendeu é que é incompetente.
- Ah ah, há um mês que se pode fazer onde se quiser, mas há quem não queira ter trabalho, sabe como é... - diz.
- Pois... depois ficam todos com má fama.
- Ora nem mais. Nem mais.

Não vou usar o nome verdadeiro desta senhora que me atendeu nas Finanças da Reboleira porque isto pode chegar até lá e ela não querer o protagonismo, por isso, vou usar o nome fictício de "dona Impecável" porque foi isso que ela foi: IM-PE-CÁ-VEL. Viu e reviu tudo, sempre sorridente, enquanto fazia contas numa calculadora dos anos 50, daquelas que sai papelinho, e anotava e voltava a fazer as contas para garantir que estava tudo certo. A situação não era trivial e esteve mais de uma hora a tentar perceber o que se passava e a melhor forma de resolver, mesmo já se tendo fechado a porta das Finanças e passado do horário de fecho das 15.30h. Nem com isso, por um segundo, tentou apressar-me e fazer as coisas a despachar e, mesmo quando eu já estava satisfeito voltou a confirmar, a imprimir tudo e deixar notas para garantir que se o problema voltasse a acontecer seria mais fácil de resolver. A meio da caça ao problema, onde eu ia mandando bitaites aleatórios sobre as potenciais causas, ela diz-me: «Eu até gosto disto. Quando é fácil não tem piada, isto assim é um desafio, parece um puzzle e temos de juntar as peças e perceber o problema.». 

A dona Impecável, nos seus cinquentas, a trabalhar numa repartição das Finanças, com a má fama de incompetente que isso acarreta, sem ar condicionado e com este calor, tinha gosto naquilo que fazia e isso fazia toda a diferença.

Saí de lá com o problema resolvido e mais do que isso: percebido. Uma coisa é saber que dois ao quadrado é quatro, outra é saber porque é que é quatro. Se toda a gente fosse como a dona Impecável, não havia piadas com funcionários públicos e repartições das Finanças. Felizmente, para mim que gosto fazer humor, que também há a dona Otária que me mandou ir a outro lado porque não queria trabalhar e a dona Arrogante De Merda que acreditou que eu tinha apagado a fotografia. 

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20 de junho de 2017

Só por curiosidade mórbida...



Todos sabemos que o ser humano tem uma atracção especial pelo que é mórbido. O exemplo típico disso é quando abrandamos o carro para ver um acidente, na esperança de podermos ver se é grave e estimar os estragos materiais e as perdas humanas através do vislumbre de sangue no chão, chapa amolgada e da quantidade de ambulâncias no local. Todos refilamos quando vemos que o trânsito, afinal, era por causa de um acidente na via contrária, mas ao passarmos pelo local também abrandamos e damos uma olhadela de relance para satisfazer a nossa curiosidade mórbida. Acontece o mesmo com as tragédias que enchem todos os jornais e especiais de notícias de horas e horas. Seja com os atentados ou, agora, com a tragédia dos incêndios que se abateu no nosso país mal-habituado a catástrofes desta dimensão, felizmente. Há um cantinho tenebroso e recalcado do nosso cérebro que espera que, de cada vez que se actualizam as notícias, o número de mortos tenha aumentado. «Isto ainda vai aos 100 mortos!», pensamos. Não ficamos tristes por não haver mais mortos, tal como não ficamos contentes se os houver, atenção, mas ficamos, à falta de melhor palavra, desiludidos da mesma forma como quando olhamos para um acidente no trânsito e afinal foi só um toque de chapa.

Há uma linha ténue entre informar e o entretenimento. «Morreram 64 pessoas» é informação, mas dizê-lo narrando uma montagem de imagens tristes em câmara lenta com uma música de fundo triste passa a ser entretenimento. Factos com uma roupagem elaborada para puxar à lágrima são entretenimento macabro. Uma das razões pelas quais vemos este tipo de notícias é para pensarmos como seria se fossemos nós a lidar com aquilo. Tínhamos dado meia volta na estrada? Feito marcha-atrás porque o carro tem o motor à frente e é melhor bater de trás sem ficar com o carro parado? Íamos a correr pela berma com um lenço ensopado em água do limpa-para-brisas? Tudo isto nos passa pela cabeça e está provado que assistir a tragédias nas quais há testemunhos de sobreviventes nos pode ajudar a não morrer caso desgraça parecida nos bata à porta. Uma vez vi uma entrevista de um gajo nu, na rua, que tinha saído de casa antes do prédio colapsar com um terramoto, sem tempo de se vestir porque estava a dormir sem roupa. Depois disso, de cada vez que me encontro todo nu na cama, antes de adormecer vou vestir uns boxers porque me lembro dessa situação constrangedora.

Ainda por cima, de noite está mais frio e era uma vergonha aparecer a Judite ao meu lado a fazer uma reportagem quando estou todo mirrado. 

Esta curiosidade mórbida pode justificar o facto de a grande maioria das notícias que fazem as manchetes dos jornais ser negativa. A maioria de nós vive num mundo fixe, sem guerra, sem fome, sem crime. Esquecemo-nos que a maioria do mundo não é assim e ficamos surpreendidos quando vemos notícias negativas, especialmente se forem perto de nós. Imaginem um telejornal em que todas as notícias eram positivas, com coisas boas que tinham acontecido a outras pessoas e feitos fantásticos que outros tinham praticado. Íamo-nos sentir uma merda. Por muito que nos custe, os jornalistas não devem criar ondas de solidariedade porque assim estão a distinguir entre tragédias de maior e de menor valor e a dizer que as pessoas enquanto indivíduos não valem o mesmo. As vidas só valem se forem à palete e se a tragédia for em grande. Porque é que se recolheram toneladas de alimentos para os bombeiros e se assobia para o lado quando nos entregam o saquinho do banco alimentar contra a fome? Todos nós temos as nossas causas e não é isso que está em causa, passe a expressão: o que está em causa é dar-se um litro de água para ajudar um bombeiro ou dar cinco euros para a conta solidária e acharmos que somos as melhores pessoas do mundo e que podemos dar lições de moral aos outros. Fixe, ajudaste. Seja para te sentires bem ou não o que interessa é que ajudaste, mas feitas as contas continuas a trazer muito mais mal ao mundo do que bem, directa ou indirectamente. Todos nós. Somos um capricho do universo que tal como o fogo consome tudo por onde passa e deixa destruição atrás com o nosso consumismo desenfreado.

Por muito que nos queiramos colocar num pedestal de empatia face às aos outros, o que é certo é que o nosso sofrimento enquanto observadores de uma tragédia dura pouco. Todos nos emocionámos ao ouvir aquele homem que perdeu a mulher e as duas filhas, no entanto, ele irá continuar a sofrer o resto da vida e nós, para a semana, já nos esquecemos.

De que serve esta compaixão lusco-fusco quando aquele homem vai passar os aniversários das filhas, da mulher, natais, dias do pai, aniversários de casamento, num sofrimento inimaginável? Nada. Não serve de nada.

Sabermos que não serve de nada deixa-nos impotentes e é isso que nos leva a canalizar a nossa frustração para outros sítios: quem tem culpa? O Governo? Os particulares que não limpam as matas? Os Koalas que gostam de eucaliptos? As pessoas que fazem piadas com tragédias? A CMTV? A Judite? Chamem-me cínico, mas se descobrissem que a única forma de acabar com os incêndios era acabar com os eucaliptos e que, por um efeito borboleta qualquer de uma cadeia de valor que desconhecemos, os iPhones iam aumentar de preço para o dobro devido a isso, queria ver como é que ia ser. Todos queremos culpados desde que não sejamos nós. Todos queremos soluções desde que não tenhamos de abdicar de nada.

Entre o incêndio no prédio de Londres e os de Pedrogão Grande qual é a diferença? Um foi no Reino Unido, outro em Portugal, sim, mas eu, como a maioria dos portugueses, não conhecia ninguém que tenha morrido nem em um, nem no outro. Porque é que me sinto mais triste por terem morrido portugueses do que ingleses? É toda uma escala de percepção de valor subjectiva que colocamos nas vidas alheias. Haverá várias explicações sociológicas e evolutivas que nos fazem sentir mais empatia pelo que nos é, aparentemente, mais próximo e uma delas posso especular que seja «Ui... tão perto! Podia ter sido comigo! Fogo, ainda bem que não foi.». Num lar de idosos, sempre que morre alguém os outros utentes ficam de rastos mesmo que não se dessem bem com quem se foi. Porquê? Por empatia, em parte, mas porque a morte dos outros lhes lembra que os próximos podem ser eles. Num mundo não muito distante, os privilegiados serão imortais e quem tem poucas posses irá continuar a morrer. Nesse sentido, quem viver na imortalidade pode perder toda a empatia e o que faz deles humanos já que a morte dos outros não lhes irá recordar o seu sofrimento ou a sua finitude. Se calhar isso justifica por que é que quem acredita na imortalidade e no paraíso muitas vezes se rebente sem compaixão pelos inocentes que leva consigo.

Todos os anos morre gente nos incêndios, mas desta vez morreram mais. No entanto, para quem perdeu os familiares é igual terem sido só eles ou eles e mais cem. Será, até, uma consolação mórbida o facto de não terem sido os únicos. Parece menos injusto quando morre muita gente da mesma causa já que a pergunta «Porquê a mim?» é feita por muitos e percebe-se a ausência de resposta ou um inevitável «A vida é mesmo assim...». Deixem-me fazer de advogado do diabo com tudo o que isso implica que é dizer coisas com as quais posso não concordar. No verão de 2015 morreram duas pessoas num incêndio que como foram só duas não tiveram direito a tanta cobertura dos media nem a ondas de solidariedade. Logo, não houve ajudas, nem dinheiro, nem nada. Parece injusto, não? Porque é que ajudamos uns e não ajudamos outros? Porque é que só queremos ajudar em tragédias grandes e nas pequenas fingimos que não é connosco? Será porque as grandes acontecem menos vezes e assim não temos de ajudar tantas vezes? Será porque ajudar nas pequenas não nos faz sentir tão bem como ajudar nas grandes? Se assim for, será que a nossa empatia por grandes causas não é egoísta? Lembrem-se que estava a fazer de advogado do diabo! Estou apenas a filosofar em voz alta qual Nietzsche da Buraca que não sabe bem o que diz, mas que gosta de fazer perguntas, mesmo que erradas porque muitas vezes são essas que originam as respostas certas.

Talvez eu seja um cobarde que não gosta de encarar a realidade, mas a verdade é que me faz confusão. Afecta-me a sanidade mental ver horas ininterruptas de desgraças. Se de cada vez que fosse jantar fora o menu do restaurante tivesse fotografias de crianças a morrer à fome em África eu passava a só comer em casa. Todos nós temos mecanismos para lidar com o estado do mundo e um deles é o humor. Depois de ficar com lágrimas nos olhos ao ver desgraças alheias, sacudo isso pensando em piadas horríveis que nem sempre as digo em voz alta. Não que não tenha coragem, mas feito o peso entre a piada e o potencial de ofensa, acho que não valem a pena. Haverá sempre quem não perceba isso e pense que empatia é querer ver todas as imagens horríveis e ir pesquisar fotos dos cadáveres no Google e expressar um sentido «Q'horror!». Outros pensam que empatia é escarrapachar um #PrayForPortugal em bold. Ultrapassa-me essa forma de compaixão.

Não sou religioso e acho que rezar está para ajudar como oferecer meias está para o Natal: é de quem não quer ter muito trabalho.

Percebo que faça sentir melhor a quem reza, mas, à partida, é só mesmo isso que faz. Mas pronto, é um facto que mal, à partida, também não vai fazer... a não ser que exista Deus e o Diabo, e o Diabo fique ciumento de estarem todos a rezar a Deus e decida mandar mais uns raios cá para baixo e incendiar mais umas matas. Não sei, quando estamos no campo da fantasia tudo é possível.

Ver pessoas a chorar os seus mortos na televisão é terrível. Aperta-nos no coração, deixa-nos a voz embargada e inunda-nos os olhos de água para apagar o fogo da tristeza. Não sou neurocientista nem psicólogo, mas diria que o processo no nosso cérebro sempre que se vê uma tragédia alheia é a seguinte:
  1. Sentimos um soco no estômago;
  2. O nosso cérebro envia sinais de desconforto ao nosso corpo;
  3. Choramos e pensamos «Coitados.»
  4. Sentimo-nos boas pessoas por empatizar com a desgraça dos outros.
  5. Sentimo-nos aliviados por não ser connosco.
  6. Achamos que vamos passar a valorizar mais o que temos e a queixarmo-nos menos das coisas pequenas do dia a dia.
Acrescentaria que nos dias de hoje o passo 7 é irmos para o Facebook indignar-nos ou mostrar que somos solidários apenas para mostrar aos outros o quão boas pessoas somos. Diria que o ponto 6 é uma das razões pelas quais somos viciados em ver desgraças alheias. Sim, temos empatia e é bom sentirmo-nos seres humanos decentes que empatizam com o seu semelhante, mas é o sentimento egoísta de que vamos mudar de vida. De que vamos passar a ser mais felizes por termos a sorte de estar vivos. De que vamos dar importância às pequenas coisas da vida e ser mais felizes. É como ver um filme inspirador que achamos que nos vai mudar os hábitos logo de manhã. Não vai e, como tal, precisamos de ver outro para voltar a ter essa sensação de renascimento. É a razão pela qual as pessoas nunca compram só um livro de autoajuda. Precisam daquele sentimento ao acabar o livro de «Vou mudar de vida!». A maioria fica na mesma e precisa desses minutos de "novo eu" outra vez. É o que está na génese daquele pessoal que faz viagens a países para ver os pobrezinhos. Há uns anos estava na moda ir à Índia e levar umas canetas para ajudar as criancinhas e vir de lá com um sentimento de «A minha vida até é bem boa e eu só me queixo...».

Consumimos o sofrimento dos outros. «Pimenta no cu dos outros é refresco.» e «Lembra-te que há sempre quem esteja pior.» são frases ditas amiúde e que comprovam isso. Há estudos que concluem que ao vermos outras pessoas em sofrimento o nosso cérebro processa essas imagens como se o sofrimento fosse nosso, tornando assim a empatia numa dor real. Há outros estudos que dizem que a empatia não é mais do que o nosso cérebro a reproduzir o nosso próprio sofrimento do passado por vermos outros a sofrer. Sentir tristeza por outros pode não ser mais do que estar triste por nos lembrarem que já estivemos tristes. A ser assim, somos todos egocêntricos, mesmo nas alturas em que pensamos estar a ser o mais despojados de ego possível. Há, também, estudos que dizem que a empatia impossibilita a mudança do mundo já que, por exemplo, a empatia nos faz dar várias pequenas esmolas que nunca mudarão nada e que esses pequenos actos de compaixão nos impedem de reunir forças para praticar o bem em grande escala e ter, realmente, impacto no mundo.

Não estou a dizer para ajudarem ou não. Não tenho soluções, só tenho perguntas.

Foi só um desabafo e uma introspecção sobre de onde vem esta coisa que chamamos compaixão que nos parece distinguir de todos os animais. Talvez seja por sermos os únicos animais que sabem que a sua existência é finita. Talvez seja esse medo da morte que faz com que nos unamos apenas quando a vislumbramos. Só é pena é que, bem vistas as coisas, a única forma de sermos um povo unido e solidário é esta merda arder toda de norte a sul.
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18 de junho de 2017

Formas de evitar tragédias como a de Pedrogão Grande



É incompreensível uma tragédia como o incêndio em Pedrogão Grande quando basta ver as redes sociais para perceber que Portugal está inundado de especialistas em incêndios. Toda a gente sabe de quem foi a culpa e como é que os bombeiros devem apontar a mangueira para extinguir as chamas. Vendo tamanho conhecimento espalhado nas redes, não quis ficar atrás e decidi dar algumas ideias que podem ajudar a prevenir que tragédias como esta se voltem a repetir. Sinto que o área do combate aos incêndios está muito ultrapassada: vivemos num mundo em que se leva homens à Lua, se aterra robôs em Marte, se faz fissão nuclear de átomos para obter energia limpa, se fazem vídeos HD com telemóveis, mas ainda se apagam fogos com mangueiras. Por isso, deixo aqui algumas ideias inovadoras que podem ajudar a combater este flagelo:

1- Um primo de um ministro cria uma empresa de limpeza de matas que é contratada por adjudicação directa. Vão ver que aí já há orçamento.

2- Todos os familiares dos deputados compram um helicóptero que depois podem alugar a preço inflacionado para ajudar a combater os incêndios. Por vezes a corrupção pode ajudar a mobilizar os dinheiros públicos para onde fazem falta.

3- Fazer como as mulheres que retiram os seios preventivamente para evitar futuros cancros: desbastar a floresta toda bem rente ou queimar com napalm para nunca mais crescer lá nada. Estamos num brainstorming, não há ideias estúpidas.

4- Criar uma app para apagar incêndios! É uma app que não serve para nada como quase todas as apps, mas por ser uma app vai atrair investimento, especialmente se for à Web Summit.

5- Em vez de os bombeiros pedirem donativos de bens alimentares via Facebook, que tal o Continente e o Pingo Doce chegarem-se à frente? Como contrapartida, os bombeiros, enquanto combatem as chamas, viram-se para a câmara e dizem «Uau, este sumo marca Continente vem mesmo a calhar neste momento de calor infernal!» enquanto bebem o pacote com o logo virado para a câmara. Quem não quiser esperar pelas grandes superfícies e quiser ajudar, pode ver aqui como e onde fazer. Também há uma campanha de crowdfunding a decorrer aqui.

6- Os governantes trocam os seus Mercedes e BMWs topos de gama por Renaults Clio em segunda mão e usam o dinheiro que pouparam para comprar viaturas de combate aos incêndios. O meu Clio de 2002 tem ar condicionado, por isso era na boa.

7- Na mesma linha, deviam trocar a viatura oficial do Marcelo Rebelo de Sousa por um carro dos bombeiros já que ele é sempre o primeiro a chegar a todo o lado. O camião dos bombeiros teria dois canhões: um de água e outro de afecto.

8- Trocar as armas dos militares por bisnagas e mobilizar o exército para combater as chamas. Incêndios são todos os anos, guerras não tenho visto nenhumas por cá. De qualquer da forma, as bisnagas podem ser realistas e servem na mesma para patrulhar e essas cenas que os militares fazem num país sem guerra.

Bem sei que algumas medidas são populistas, mas ao menos tentei dar algumas ideias criativas e fazer parte da solução e não do problema. Agora vou ali à praia que estou a morrer de calor. Sem ofensa.
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16 de junho de 2017

A moda do gin com salada lá dentro



E os gins que continuam na moda? É verdade. Vieram para ficar, está visto. Às vezes penso em quem terá iniciado esta moda do gin de balão com salada lá dentro. Terão sido as marcas de gin, de água tónica ou os agricultores de pepinos? Imagino uma espécie de agricultor hipster de pepinos, que já os cultivava antes de serem cool, a ser gozado pelos seus colegas que plantavam batatas e outros legumes e tubérculos mais mainstream:

- Ó Manel, como foi a venda no mercado?
- Muito fraquita. Só me levaram meia dúzia de pepinos.
- Também para que plantas tu pepinos? Ninguém gosta disso! É um nicho muito pequeno! Tens de plantar é batatas e agradar às massas, e não estou a falar de esparguete.
- Isso não é desafio para mim. Pepinos é que é! Um dia vocês vão ver! O pepino tem finalidades nutricionais, estéticas e recreativas! (como escrevi neste texto)

Nisto, o Manel incumbiu-se da missão de fazer do pepino um dos vegetais mais consumidos no mundo e juntou forças ao gin Hendrick’s. Começaram a fazer campanhas publicitárias e a trazer o gin de volta, mas desta feita com pepino lá dentro. Agora o Manel é o agricultor mais rico lá da terra dele porque cada rodela num gin custa 5€. Vai buscar. Todos os outros agricultores querem plantar pepinos e o Manel goza com eles dizendo «Já plantava isso antes de ser fixe plantar isso.» enquanto ajeita a sua echarpe roxa e ajusta os seus óculos de ver de massa sem lentes. Bem, talvez não tenha sido assim que tudo aconteceu, espero que não sigam este blogue a contar com factos históricos, mas o que é certo é que o gin está para ficar. Eu tenho uma dicotomia de sentimentos em relação ao gin: por um lado gosto de um bom gin, por outro lado acho que é uma moda meio parva, a começar logo pela preparação: tem de se passar o gelo no copo para ficar gelado, tem de se passar folhinhas de menta e casca de limão nas bordas para aromatizar, depois uma baga de zimbro, uma folha de louro, um cardamomo, um bocado de laranja, dois dentes de alho, vinagre balsâmico e um patinho de borracha para enfeitar. No fim, o pior, tem de se deitar a tónica numa colher em espiral para não quebrar as bolhinhas frágeis da menina. Com isto tudo, se estás numa fila de cinco pessoas no bar e todas pedem um gin, só vais beber quando já tiveres fome e talvez seja por isso que metem uma salada para dentro do copo. Fazem isto tudo que é para depois no fim quando te pedirem 15€ pelo gin tu pensares «Epá sim senhor, o gajo até teve bastante trabalho com isto.». Tretas. Em casa meto duas rodelas de pepino no copo, gin lá para dentro sem ser preciso medidor, e água tónica a encher o copo.

Qualquer dia o gin une-se ao sushi e o balão vem com bocados de alga e um peixinho dourado vivo, com duas palhinhas especiais que servem de pauzinhos para comer.

Claro que quando o gin é do carrascão (não vou estar a acusar marcas), que se comprou para a passagem de ano, convém meter o máximo de cenas para dentro do copo para disfarçar o sabor a morte de fígado. Até açúcar e um peito de frango grelhado se deve adicionar. Agora, quando o gin é bom (como o Hendrick’s que fez parceria comigo para escrever este texto), até podem beber da garrafa, desde que de forma responsável, se é que isso é possível.

***

Em honra do gin simples porque a qualidade é boa e não precisa de ficar camuflado na salada, o Hendrick’s criou o Dia Mundial do Pepino cujas celebrações incluem a festa "A Cidade Labiríntica do Sir Pepino", na bela cidade do Porto, dia 17 de junho. Podem ver mais informações aqui e aqui.
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14 de junho de 2017

O pepino é o melhor amigo da mulher



Hoje celebra-se o Dia Mundial do Pepino e, por isso, vou contar-vos uma bonita história sobre um pepino chamado Zé. Zé era um pepino com um índice de massa corporal acima da média. Um pepino de ossos largos ou, se preferirem, gordo. O Zé vivia num cesto no mercado do Bolhão, no Porto, juntamente com outros pepinos que faziam pouco dele por ser roliço e o faziam sentir-se mal com a seu diâmetro balofo. O Zé queixou-se à comissão de proteção dos pepinos a dizer que sofria bullying, diariamente, mas ninguém fez nada.

Certo dia, uma mulher, cliente do mercado, agarrou num daqueles sacos de plástico que ainda não se pagam, e levou uns quantos pepinos com ela. Pela primeira vez, o Zé, que era sempre preterido em relação a outros pepinos mais maneirinhos, também havia sido escolhido para esta viagem que culminaria em sacrifício dos pepinos. Os pepinos estavam contentes e ansiavam por tal fim em prole de um bem maior do que eles.

Chegando a casa da mulher, faziam apostas sobre a utilidade que lhes seria dada. Fins de beleza, nutricionais ou práticos? Só o tempo o diria.

O primeiro pepino foi cortado às rodelas para servir de máscara de beleza e melhorar os bicos de papagaio da mulher. Um fim digno para qualquer pepino que se preze que ainda poderá ter a sorte de ser fotografado e colocado no Instagram de uma qualquer blogger de moda.

O segundo pepino foi, também, fatiado, mas desta feita para uma salada de alface. O verão está aí e ajudar a manter a linha é um dos objetivos de qualquer pepino.

O terceiro pepino teve um dos fins mais nobres de qualquer pepino nos dias de hoje: para aromatizar um gin Hendrick’s. Talvez o único sítio onde o pepino não sabe mal, se é que querem saber a minha opinião. Não é que saiba mal noutros gins, mas foi com o Hendrick’s que fiz parceria para escrever este texto.

O quarto pepino foi cortado pelo namorado da mulher quando ela lhe pediu para ir preparando as courgettes para o jantar que, como a maioria dos homens, não soube distinguir um pepino de uma courgette. Um sacrifício desnecessário, pensam? Não, já que depois o usou para engraxar os sapatos. Sim, pepino serve para deixar os sapatos brilhantes segundo a minha pesquisa no Google sobre as utilidades do pepino. Foi um risco essa pesquisa, especialmente na zona das imagens.

Nisto, já todos os pepinos gozavam com o Zé a dizer que ele tinha sido comprado por engano e que nunca seria utilizado para nada. O Zé acabrunhava-se no canto do saco de plástico pousado na segunda prateleira do frigorífico, tímido e com medo de perecer oxidado, encarquilhado e malcheiroso e de ver a sua vida sem propósito deitada ao lixo. Nem os gatos vadios o iriam comer, como se pode ver em vários vídeos da Internet de gatos assustados com pepinos.

O quinto pepino foi inteiro para uma liquidificadora para ser triturado juntamente com espinafres, brócolos, cenoura e gengibre. Uma sopa? Não, um sumo detox daqueles que sabem tão bem como óleo de fígado de bacalhau deixado ao sol durante um verão inteiro. Fazem bem? Devem fazer melhor do que um gin (menos Hendrick’s, claro!), mas não sei se compensará.

O sexto pepino foi cortado ao meio e foi passado no espelho da casa de banho. Os outros pepinos estranharam, mas ao que parece passar um pepino num espelho impede que este fique embaciado pois o seu suco forma uma fina película brilhante. Ao serem informados disto, os pepinos sentiram orgulho de ser pepinos. O Zé pensou «Porque é que não fui eu escolhido para esta tarefa, já que sendo mais gordo, cobriria mais superfície do espelho de uma só passagem?». Veremos, em breve, que o Deus dos pepinos escreve certo por linhas tortas.

Na manhã do dia seguinte, dois pepinos foram retirados de uma só vez para serem triturados e comidos à colher enquanto a mulher se queixava de uma enorme dor de cabeça. Os pepinos são excelentes para curar a ressaca. Talvez a mulher tivesse bebido demasiado gin de má qualidade (e não Hendrick’s) na noite anterior.

Ao cair da noite, a mulher acendeu umas velas e uns incensos e tomou um banho de imersão. Ao sair do banho, ainda apenas de toalha, abriu o frigorífico para ver se haveria algo para comer, mas viu o seu olhar preso ao Zé. Hesitou. Mordeu o lábio e lançou a mão para o retirar do saco. Os restantes pepinos não queriam acreditar que o Zé seria o escolhido em vez deles. Porque havia sido selecionado aquele pepino grosso e trapalhão que ninguém queria? Um mistério que nunca ninguém iria descobrir já que, no dia seguinte, a mulher apareceu com o Zé numa mão, passou-o por água e voltou a colocá-lo no saco. Os outros pepinos riram-se na cara pepinesca do Zé. Riram e riram e disseram que ele era o pior pepino de sempre e que não havia registos da história de um pepino escolhido para o sacrifício ter sido rejeitado! O Zé virou a chacota daquele frigorífico onde até os pepinos em pickles, discriminados por tantos, se riam dele. No entanto, o Zé tinha um sorriso na cara de quem já não se importava com o que diziam dele. Sabia bem o que tinha acontecido e para que fim maior tinha sido escolhido naquela noite.

A autoconfiança do Zé era tão grande que não havia bullying que o deitasse abaixo. O Zé, para além de ser o mais gordo, sentia-se o maior daqueles pepinos todos.

O Zé é apenas um dos muitos pepinos heróis deste mundo que já mereciam um Dia Mundial do Pepino, agora criado pelo Hendrick’s. Para celebrar os labirintos da vida dos pepinos, em tanto semelhantes aos nossos, no próximo dia 17 haverá a festa "A Cidade Labiríntica do Sir Pepino", na bela cidade do Porto, terra natal do Zé. Podem ver mais informações aqui e aqui.

Não me quero gabar, mas um texto sobre pepinos que consegue ser informativo, com uma mensagem forte sobre o bullying e ainda um bocado javardo, dependendo da mente indecente de cada um dos leitores, é um bom texto. Acho que até merece ser partilhado.
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