16 de janeiro de 2014

Ronaldo e as lágrimas de ouro



Já tudo foi dito e escrito sobre a vida de Cristiano mas as pessoas tendem a esquecer. As pessoas são invejosas e têm memória curta. Esquecem-se que vem de família pobre, quão pobre? Bastante. Mais do que a maioria. Esquecem-se que veio para Lisboa sozinho, aos 11 anos, para um mundo novo sem ninguém da família para o apoiar. Esquecem-se que chorou tudo o que tinha a chorar, à noite, na almofada, na academia do Sporting quando tinha saudades dos pais. Esquecem-se que ele trabalhou diariamente, anos a fio para chegar onde chegou. Dizem que ainda hoje é o primeiro a chegar e o último a sair dos treinos, fora as imensas horas extra que teve que fazer (e ainda faz) no ginásio para ter um corpo quase à prova de lesões. Esquecem-se que o pai lhe morreu cedo. Esquecem-se que foi com 18 anos para o Reino Unido. Esquecem-se que começou a ganhar balúrdios, que não conseguimos imaginar, numa idade em que a maioria de nós ainda nem trabalha. Um rapaz dessa idade que decide levar os melhores amigos com ele para lhe fazerem companhia. Para lhes dar uma boa vida e para o blindarem de novos amigos interesseiros que aparecem no horizonte sempre que a fama se faz nossa companheira. Alguém que faz isso é inteligente.

Portugal nunca deu valor aos seus heróis corajosos e confiantes. Pelo menos não depois da ditadura. Agora idolatram-se Zé Marias e falsas humildades.
O Ronaldo (e o Mourinho um pouco também) é exemplo disso.

"Porque ele é arrogante em dizer que é o melhor". Ouve-se este tipo de comentários várias vezes. Claramente que as pessoas têm uma noção de humildade retorcida. É como achar mais humilde aquele aluno que aquando da auto-avaliação diz que merece um "17" quando teve 20 em todos os testes, só para parecer bem, do que o aluno que diz confiante que merece "20". Esta é a noção triste de humildade que temos em Portugal. Para mim humildade máxima é seres considerado o melhor do mundo, achares-te o melhor do mundo, e mesmo assim no dia a seguir seres o primeiro a chegar ao treino e tentares melhor apesar de tudo e todos te considerarem o melhor do mundo. Isso é humildade. É ser-se o melhor, sabe-lo, e ainda assim tentar melhorar todos os dias.

"Ai porque ele só quer é pausar e preocupar-se com o cabelo e carros". A grande maioria já anda a gastar o dinheiro dos pais todos os fins de semana nos copos e depois vêm criticar como ele gasta o dinheiro que conquistou apenas e só com o seu suor? O Sporting tem mérito na formação do jogador e do homem que ele se tornou. Tem muito mérito. Mas o mérito é quase todo dele. Dele e da família, que bimba ou não, é muito mais família que as famílias de renome que tratam os filhos por você.

A inveja é fodida. A admiração tem sempre a sua quota parte de inveja. Há uns que se sentem inspirados e há outros, demais, que se inspiram a dizer mal. É fodido ele ser um dos portugueses que mais ganha dinheiro no mundo. É fodido ele ser o mais famoso português da actualidade. É fodido ele ter um corpo que todos queriam ter. É fodido ele ter 90% das mulheres do mundo a quererem-lhe saltar em cima. É fodido ele ser o melhor naquilo que faz e aquilo que faz ser uma coisa que 90% dos homens queria fazer. Eu tenho inveja dele. Mas uma inveja cheia de orgulho de ser português.

"As lágrimas humanizaram a máquina Ronaldo" - Disse um dos comentadores quando o Cristiano tentava discursar. É preciso chorar para se ser apreciado neste país? Não há lugar para os confiantes? Para os que do alto da arrogância de quem não deve nada a ninguém por tudo o que conquistaram poderem dizer que se acham os melhores? Só há lugar para os Zés Marias, humildezinhos e coitadinhos.

Eu gostei de o ver chorar, não digo que não. Emociou-me. Emociou-me porque gosto de vencedores que batalharam para vencer e não têm medo de afirmar que se acham bons. Mas emocionou-me principalmente porque sou português, e porque nesta altura precisamos de heróis. Heróis que lutam, que arriscam, que respondem a quem os trata mal, que choram quando vencem e não quando perdem. Faltam-nos mais Ronaldos. Se deixarmos os Zés Marias e começarmos a ser mais Ronaldos, se calhar isto anda mais depressa para a frente.




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